O termo muralismo, ou pintura mural, foi cunhado a partir das pinturas feitas no início do século 20, no México. O muralismo, portanto, é uma manifestação artística que tem características populares. Já a Academia Brasileira de Letras (ABL) é um templo da erudição e das letras. Mas quem disse que a arte erudita não pode se associar à arte popular? O milagre aconteceu nesta tarde, quando a Academia Brasileira de Letras (ABL) inaugurou o Mural Machado de Assis, produzido pelo coletivo Negro Muro, com apoio e patrocínio da Santafé Ideias, agência de comunicação responsável pela gestão da presença digital da Academia. Este mural, que celebra os 185 anos de nascimento de Machado de Assis (1839-1908), cobre 150 metros e traz imagens alusivas ao escritor e às suas obras.
O projeto Negro Muro, idealizado por Pedro Rajão e Cazé em 2018, tem como objetivo valorizar figuras históricas negras por meio da arte urbana. É a arte popular com seu lugar de fala. A concepção do mural em homenagem a Machado de Assis começou a ser discutida em 2023, e agora, quase um ano depois, o projeto é concretizado na sede da ABL.
O mural exibe um grande retrato do maior escritor brasileiro, pintado à mão, com referências estéticas do Rio de Janeiro do século XIX, além de elementos pessoais da vida do autor, como sua mulher, Carolina Augusta, sua paixão pelo xadrez e sua trajetória como tipógrafo, entre outras surpresas. A obra, inspirada em uma imagem do escritor encontrada nos arquivos da ABL, começou a ser pintada no dia 21 de agosto.
O presidente da Academia Brasileira de Letras, o jornalista e escritor Merval Pereira, destaca que o projeto é o ponto culminante de uma série de ações da ABL em homenagem a Machado de Assis ao longo deste ano. Entre essas ações, destaca-se o avatar do escritor, fruto de uma parceria entre a ABL, a agência de comunicação Santafé Ideias e a empresa de inteligência artificial Euvatar. O dispositivo, de tamanho humano, está disponível para interação com os visitantes da ABL, comunicando-se em tempo real e respondendo a perguntas sobre a vida e a obra de Machado de Assis.
Outra iniciativa importante foi o Ciclo de Conferências da ABL, que durante o mês de junho debateu a obra do autor e a questão racial, em encontros abertos ao público que contaram com palestrantes como Jeferson Tenório, Ana Flávia Pinto e Paulo Dutra. Além disso, em colaboração com a Flup e a Universidade das Quebradas da UFRJ, a ABL está promovendo até outubro um curso de formação de escritores voltado para alunos das periferias, com foco na discussão do tema racial nas obras do escritor.
“O projeto Negro Muro é importante para a memória negra, e sua arte gera muita estima para a sociedade, aguça a curiosidade e provoca um debate na cidade. Trata-se de mais uma interação da ABL com a cidade e seus cidadãos, que terão à sua disposição uma obra de arte de grande repercussão”.
O pesquisador Pedro Rajão observa que, embora a produção escrita de Machado de Assis não contenha uma autoidentificação racial explícita, ela reflete claramente a experiência do autor como homem negro, o que influenciou tanto sua literatura quanto sua biografia. “O projeto artístico e educativo em questão busca evidenciar, de forma inquestionável, a negritude de Machado, trazendo essa perspectiva à tona para todos que passam pelo local”, afirma Rajão.
Imprimir