Este atravessar junho-julho tem sido um tempo de sofrimento. Para o povo brasileiro, a provação de ver a seleção de ouro tornar-se pó sem fazer uma partida que pudesse lembrar de leve o brilhante futebol brasileiro, que encantava a todos nós e fez fama e escola pelo mundo inteiro. Os "experts" -e eu não sou nem de leve um- dizem que tínhamos excelentes jogadores, mas que não tínhamos equipe. Para mim, é um paradoxo, mas, para os entendidos, faz sentido. Até torcedor sou contido e, às vezes, relapso em assistir às partidas de maior impacto.
Mas ao nosso sofrimento juntou-se o de espanhóis, alemães e portugueses, para não estender a lista -restando a perspectiva da coroa final da glória a França e Itália. Ao vencedor, repitamos Machado de Assis, as batatas.
Mas sofrimento, também não dos menores, começa agora para os candidatos aos postos eletivos. Não é só a angústia de não se eleger, mas a via-crúcis do emaranhado de leis que enfrentam, desde o pedido da documentação do registro até ao que se pode e não se pode fazer.
Quando a gente lê toda ela, vê a que ponto de desprestígio e desmoralização chegou a classe política. Detalha-se a lei de todo jeito -e é bom e necessário- para não deixar portas nem frestas a coisas ruins. Parece mais um compêndio de como defender-se das doenças nas cidades na Idade Média.
A primeira humilhação é que o candidato deixa seu nome, passado, qualidades, marcas e virtudes para ser simplesmente um número. A informática é um avanço, mas esse negócio de transformar as pessoas em número, que me parecia no passado coisa dos tiros-de-guerra (avança o 31, engatilha o 23 etc.), chegou à política. Eu, por exemplo, a partir de agora, sou o 151, que é número que me foi dado pela Justiça Eleitoral para ser candidato novamente a senador.
Quando estranhei isso, minha mulher foi logo, com seu bom senso, me advertindo: "Não reclame. Você perdeu o juízo depois de velho. Na sua idade ainda metido em eleição". Fico calado e faço uma reflexão sobre o que ela está pensando: "Ficar em casa, caminhar, ver televisão, escrever, ler e espoucar bolinhas de plástico". Mas reajo como posso: "Ainda posso ser útil ao país e não tenho temperamento para essa folga toda, que deve ser boa para gente nova, e não para velho. Estes são para trabalhar e se preocupar. Deus não é representado como velho?". Nem aí eu tenho razão, pois, até o Renascimento, ele era representado como um jovem.
Mas humilhação mesmo de candidato foi quando me trouxeram um papel para que eu declarasse minha escolaridade. Não resisti e escrevi: "Sei ler e escrever". Só Felipão e eu fomos mais que humilhados nestes dois dias.
Folha de São Paulo (São Paulo) 07/07/2006