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De olho em 2022

 

As primeiras pesquisas eleitorais demonstram que a polarização política entre extremos está sendo reduzida nos grandes centros, com o presidente Bolsonaro e o ex-presidente Lula sendo cabos eleitorais de pouca serventia. O caminho parece aberto para candidatos do centro democrático, sendo a experiência política uma qualidade requerida pelo eleitorado, mesmo que talvez signifique também ambientação a um sistema visto como corrompido.  

O melhor exemplo que une experiência e bem sucedida atuação de um candidato novo na política é o prefeito de Belo Horizonte Alexandre Khalil, que pode ser reeleito no primeiro turno derrotando forças políticas tradicionais como PT e PSDB no Estado de Minas.  
 
O exemplo contrário está no Rio de Janeiro, onde o prefeito Marcelo Crivella vai se desmanchando no processo eleitoral, com o presidente Bolsonaro evitando uma aproximação que seria natural. O presidente e Lula são os cabos eleitorais mais rejeitados no Rio, um estado que passou recentemente pelo trauma de um governador que representava enganosamente o novo na política, foi catapultado ao poder pelo apoio da família Bolsonaro, à qual traiu na ânsia de dar passos além de sua curta perna política.  

O fantasma da corrupção na política assombra vários candidatos na eleição do Rio, sendo que os dois que lideram a pesquisa, Eduardo Paes e Crivella, andam às voltas com processos. A boa experiência de Paes como prefeito se contrapõe à atual gestão catastrófica de Crivella, o que justifica o favoritismo do primeiro.  

Com as novas regras que impedem as coligações proporcionais, ficará mais difícil para partidos sem base territorial cumprir as cláusulas de barreira. Ter uma base municipal forte é um passo importante para a formação de bancadas de deputados federais mais adiante em 2022, e também de um Fundo Eleitoral que é proporcional ao número de cadeiras dos partidos.  

A partir das eleições deste ano, os partidos mais fracos desaparecerão, sem eleger candidatos, ou terão que procurar fusão para poderem enfrentar uma eleição geral sem coligações proporcionais e com cláusulas de barreira. A força municipal terá, portanto, inevitável reflexo nacional.  

O presidente Bolsonaro, sem partido, poderá complementar sua conversão à velha política se filiando a um dos partidos do Centrão. Mesmo que não se concretize, o convite do MDB para que o presidente entre no partido é a mais vigorosa imagem da realidade política brasileira. O MDB está preparado para voltar ao centro da disputa eleitoral oferecendo uma estrutura política nacional das mais fortes.  

Em São Paulo, o embate parece ser entre o governador João Doria e o presidente Bolsonaro, que abriu seu apoio a Russomano sem se precaver de uma provável decaída de seu candidato, que tem fama de cavalo paraguaio que larga na frente e perde o fôlego na reta final. A diferença dele para o prefeito Bruno Covas já está encurtando.  

Lula parece não ter chance com o candidato puro sangue Jilmar Tatto, assim como no Rio a ex-governadora Benedita da Silva sugere não ter fôlego para ir ao segundo turno. A insistência do ex-presidente de controlar a indicação dos candidatos municipais, em vez de aceitar fazer alianças com candidatos mais fortes, como é o caso de Boulos do PSOL em São Paulo, revela uma tendência individualista que já não corresponde à sua força política.

 Até mesmo em Recife, onde a petista Marília Arraes está em segundo lugar, a influência de Lula parece menor do que a disputa entre o clã Arraes. João Campos, do PSB, é filho de Eduardo Campos e bisneto de Arraes, enquanto Marília, do PT, é sua neta.  

As eleições municipais, embora tenham um peso maior das questões locais, são fundamentais para a organização política de futuras candidaturas nacionais, pois fortalecerão os partidos regionalmente, dando bases de prefeitos e vereadores para uma eventual campanha presidencial. O aparente declínio da polarização entre os extremos pode indicar que alternativas a ela tenham mais chance em 2022.  

O Globo, 11/10/2020