O Supremo Tribunal Federal (STF) tem sido uma barreira de contenção a arroubos autoritários do governo nesses tempos da pandemia da Covid-19. Várias decisões já foram tomadas para definir os limites de atuações dos governos estaduais e municipais na implementação de medidas mais rigorosas de isolamento social, mesmo à revelia do governo federal.
O presidente do STF, ministro Dias Toffoli, defende que a segurança jurídica de decisões urgentes seja garantida, mesmo que prazos e exigências legais sejam alteradas pela situação excepcional. Somente um ministro, Ricardo Lewandowski, não entendeu o momento especial que vivemos e barrou com burocracia sindicalista a permissão para que as empresas entrem em acordo com os empregados para cortes salariais equivalentes à redução da carga horária de trabalho.
A exigência de intermediação de sindicatos para esses acordos têm criado problemas para as empresas que já os formalizaram, inclusive aumentado os seus custos, pois há sindicatos cobrando taxas de empregados e empregadores para homologar os acordos trabalhistas. Na quinta-feira, o plenário do Supremo decidirá essa questão.
O vice-presidente do STF, Luiz Fux, que assumirá a presidência em setembro, tem se posicionado em entrevistas e artigos a favor da necessidade de “sensibilidade judicial superior ao mero dogmatismo jurídico”.
O valor da saúde pública, e a prevalência da ciência em momento sem precedentes, devem guiar as ações judiciais, defende Fux, que cunhou a máxima “coronavírus não é Habeas Corpus” para chamar a atenção do perigo que as decisões genéricas de soltura de presos por causa do novo coronavírus representam para a sociedade.
Essa atitude pode criar uma “política criminal perversa e de danos irreversíveis”. Segundo o ministro Luiz Fux, cada magistrado deve levar em conta as consequências de sua decisão, pois a liberação de presos de periculosidade real é moralmente indesejada pela sociedade.
Exemplo de contenção foi a decisão do ministro Luis Roberto Barroso, que proibiu o governo federal de veicular a campanha publicitária "O Brasil não pode parar", incentivando a população a retornar à vida normal, pois a situação é "gravíssima" . Na avaliação de Barroso, a propaganda “desinforma” as pessoas.
"Em momento em que a Organização Mundial de Saúde, o Ministério da Saúde, as mais diversas entidades medicas se manifestam pela necessidade de distanciamento social, uma propaganda do governo incita a população ao inverso. Trata-se, ademais, de uma campanha 'desinformativa': se o poder público chama os cidadãos da "Pátria Amada" a voltar ao trabalho, a medida sinaliza que não há uma grave ameaça para a saúde da população e leva cada cidadão a tomar decisões firmadas em bases inverídicas acerca das suas reais condições de segurança e de saúde", alertou Barroso.
Também o ministro Marco Aurélio Mello estabeleceu que governadores e prefeitos têm autonomia para determinar restrições à locomoção das pessoas em Estados e municípios, tornando sem valor uma medida provisória do governo que estabelecia que somente as agências reguladoras federais poderiam editar restrições à locomoção dos cidadãos.
Na disputa de Bolsonaro com os governadores, venceram esses, com o apoio do STF, fazendo com que as medidas de restrição à circulação ganhassem força, embora o governo federal também possa tomar decisões sobre o tema, considerando que, diante da pandemia do coronavírus, deve-se “ter a visão voltada ao coletivo”.
O ministro Gilmar Mendes também se manifestou diversas vezes pelas redes sociais, inclusive na crise entre Bolsonaro e o ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta. Segundo ele, o presidente da República tem todo o direito de demitir ministros de Estado, se considerar conveniente, mas não pode adotar “políticas genocidas”.