A falácia do golpe caiu por terra no momento em que o PT aceitou fazer um acordo com o PMDB de Renan Calheiros e Eduardo Cunha para garantir que a ex-presidente Dilma, mesmo retirada da presidência por força do impeachment aprovado por mais de 2/3 do Senado, possa exercer outras funções públicas, além de votar e ser votada.
Ao aceitar esse absurdo fatiamento da Constituição, o PT terminou por avalizar todo o processo, e mais: firmou um acordo por baixo dos panos com aqueles líderes do PMDB que demonizaram nos últimos meses, especialmente Eduardo Cunha.
O acordo, avalizado pessoalmente pelo ministro Ricardo Lewandowski sem que o plenário do Senado fosse sequer consultado, acabou dando à decisão final um toque surrealista de parlamentarismo à brasileira, o mesmo parlamentarismo que foi negado pela própria presidente Dilma durante o processo.
Tanto o advogado José Eduardo Cardozo quanto a própria Dilma disseram diversas vezes que estávamos no presidencialismo, e portanto não era possível retirar uma presidente da República “pelo conjunto da obra”, e nem mesmo pela falta de governabilidade.
Mesmo sabendo que essa não era a base legal para o impeachment, mas sim as “pedaladas” fiscais e os decretos editados sem a permissão do Congresso, insistiam os dilmistas em que o Congresso estava agindo como se estivéssemos num sistema parlamentarista, onde uma moção de desconfiança basta para mudar o governo.
Pois bem, ao aceitar fatiar a letra do artigo 52 da Constituição, permitindo que a ex-presidente fosse retirada da presidência da República sem a pena cumulativa de ficar inabilitada para o exercício da função pública, operou-se no país uma decisão digna de um “parlamentarismo Tabajara”, para usar a expressão “impeachment Tabajara” com que o ex-ministro do STF Joaquim Barbosa cunhou a decisão tomada pelo Senado.
Referia-se ele a um quadro humorístico do grupo Casseta e Planeta de saudosa memória na televisão. O golpe verdadeiro dentro do golpe falacioso com que os dilmistas e agregados quiseram ridicularizar o processo de impeachment continuará nos assombrando com as diversas ações no Supremo Tribunal Federal.
Um dos recursos de José Eduardo Cardozo repete uma alegação já levantada durante a fase dos debates pelo senador petista Jorge Vianna, de que a Lei de impeachment de 1950 não foi recepcionada pela Constituição de 1988, Vianna considerando-a “antidemocrática”, e Cardozo no que se refere a aspectos de crime de responsabilidade de presidentes.
Cardozo argumenta que a condenação se baseia no Artigo 11 da lei, e a Carta já não consideraria crime uma ação “contra a guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos”. Ao contrário, estão caracterizados como crimes: 1 – ordenar despesas não autorizadas por lei ou sem observância das prescrições legais relativas às mesmas; 2 – abrir crédito sem fundamento em lei ou sem as formalidades legais.
Além do mais, como lembra Raphael Carneiro da Rocha, Procurador do Estado do Rio, “toda legislação infraconstitucional anterior que não seja incompatível com a nova Constituição conserva sua eficácia, como determina o princípio da continuidade da ordem jurídica”.
A prova de que não se deve levar a sério essa tentativa de desqualificação do processo de impeachment, a que só os militantes bolivarianos e os inocentes úteis aderiram, é que apenas as nações bolivarianas como Equador, Bolívia e Venezuela e Cuba protestaram contra a medida, enquanto o Uruguai apenas a lamentou.
O presidente Michel Temer começa sua atividade internacional como representante oficial do Brasil pelas potências reunidas na China no G-20, impondo a realidade política do país aos esperneios dos aliados do governo legalmente deposto.