Crise crônica da segurança pública ganhou na madrugada de domingo um capítulo cinematográfico, com o resgate de bandido no sexto andar do Hospital Souza Aguiar.
Mesmo que o tal decreto tenha sido uma astúcia mineira de nosso governador em exercício para dramatizar a gravidade da crise financeira e obter logo a ajuda federal, a calamidade de fato existe e é sentida pela população no dia a dia. Os servidores públicos, por exemplo, estão com seus pagamentos atrasados pelo segundo mês consecutivo, professores em greve há meses, escolas ocupadas e hospitais à míngua. Para só citar o Pedro Ernesto, referência em várias especialidades, inclusive cirurgia cardíaca, hemodiálise e transplantes: como consequência de dívidas com os fornecedores, serviços essenciais estão funcionando precariamente. Esta semana mesmo, foram suspensas por um dia as cirurgias eletivas, como protesto contra a falta de repasse de verbas. Sem falar na maioria das 29 UPAs estaduais, que só estão atendendo a emergências.
E, se não bastasse, há a crise crônica da segurança pública, que na madrugada de domingo ganhou um capítulo cinematográfico, com o resgate no sexto andar do Hospital Souza Aguiar de um bandido ferido no rosto, com dificuldade de caminhar e pesando mais de cem quilos: o Fat Family. Foi uma operação de guerra, envolvendo cerca de 20 homens armados de pistolas, fuzis e granadas, numa demonstração espetacular de como nossos marginais estão preparados, e as forças da ordem, despreparadas. Eles planejaram tudo — sabiam onde o comparsa se encontrava e até que seria preciso um alicate grande para romper as algemas que prendiam o perigoso paciente à cama.
Depois do desaforado feito, comemoraram num vídeo na internet (“o mano tá aqui com nois”), enquanto as autoridades policiais discutiam, tentando descobrir os responsáveis pelo trágico vexame, que custou a vida de um inocente que chegava em busca de socorro. O PM que custodiava o preso disse que alertou seus superiores sobre o plano de resgate. Outro alegou que quis transferi-lo, mas os médicos não deixaram. A Secretaria de Saúde negou que tivesse havido o pedido. Enfim, um bate-boca que envolveu até o secretário de Segurança, que se queixou de “uma cidade sem limites”, difícil de ser policiada, “uma verdadeira esculhambação urbanística”.
Com a experiência de ter sido a primeira mulher a chefiar o sistema penitenciário no Rio, a socióloga Julita Lemgruber desabafou num e-mail para esta coluna na tarde em que uma senhora e um rapaz inocentes foram mortos em meio a um tiroteio no Morro do Alemão: “Esses irresponsáveis, responsáveis pela segurança pública do Rio, estão perdidos e, com a proximidade da Olimpíada, estão arrepiando nos morros de nossa cidade”.
Que passe logo esse inferno astral, onde só os bandidos sabem o que fazer. Que venha a tão esperada festa, a dos Jogos Olímpicos.