A presidente Dilma, cujo único patrimônio era sua suposta honestidade, vai sendo tragada pela enxurrada de delações premiadas que a colocam no centro das atividades corruptas das administrações petistas, como não podia deixar de ser. Seria estranhável que tantas falcatruas e transações tenebrosas venham sendo praticadas há 13 anos sem que ela, e seu tutor Lula, nada soubessem.
Hoje, os dois alvos preferenciais dos milhões de brasileiros que foram às ruas no domingo dar-se-ão um legítimo abraço de afogados, Dilma abdicando em favor de Lula, ela para tentar salvar seu governo que caminha para o fim antes do tempo, ele para tentar um salto triplo carpado que possa recolocá-lo na disputa presidencial de 2018, mas, sobretudo, para fugir do alcance do Juiz Moro.
Nunca aquela música cujo refrão dizia “se gritar pega ladrão, não sobra um meu irmão” foi tão apropriada para a trilha sonora desses tempos políticos, em que as ruas sabem o que não querem. Não querem mais essa baixa politicagem, essa permissividade, que abre espaço para todo tipo de mutretagem, apartidariamente.
Mas, mesmo com as acusações sendo espalhadas no ventilador para todos os lados, nunca houve manifestações tão focadas como as de domingo, contra Dilma, contra Lula, contra o PT, pelo impeachment e a favor do Moro. Quer dizer, a favor da decência na vida pública, em todos os seus aspectos.
Provavelmente hoje também o ministro Aloizio Mercadante deixará seu posto, varrido pela revelação de sua tentativa de obstruir a Justiça. Suas explicações foram tão bizarras que nem mesmo a presidente Dilma, sua grande e talvez única aliada – Mercadante não é especialmente gostado no meio político – acreditou.
Se achasse mesmo que seu ministro procurara o assessor de Delcídio com espírito humanitário, em solidariedade ao sofrimento de sua família, por que Dilma emitiria aquela nota extemporânea para afirmar que qualquer coisa que aconteceu não teve nem terá seu apoio? Foi um bilhete azul que Mercadante fingiu não entender, mas a ficha dele cairá mais cedo ou mais tarde, mesmo por que dizem que o novo manda-chuva no pedaço, que nunca engoliu Mercadante, quer vê-lo fora do ministério em que assumirá papel de relevo.
Lula acha que Mercadante prejudica sua imagem, vejam vocês, que triste fim daquele que chegou a almejar ser o candidato governista na eleição de 2018.
O poder quase mágico atribuído pelos petistas a Lula, no entanto, terá que se defrontar com a realidade, que nada tem a ver com o realismo mágico de nossa cena política, onde tudo é possível, inclusive dormir no Brasil e acordar na Venezuela, como definiu uma amiga.
A realidade das ruas clamando por Justiça e honestidade não combina com a nomeação de Lula para obter foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal. O constitucionalista Gustavo Binenbojm, Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, diz que o propósito indisfarçável de burlar a regra de competência do “juiz natural” deverá desafiar os Ministros do Supremo Tribunal Federal.
Binenbojm entende que há duas possibilidades para o Supremo coibir essa manobra:
(I)A primeira seria adotar o entendimento de que, em relação a fatos pretéritos ao exercício da função ministerial (isto é, quanto a fatos anteriores à nomeação para o cargo de Ministro de Estado), a competência subsiste nas instâncias ordinárias. Tal entendimento importaria a revisão parcial da jurisprudência da Corte, que tem entendido que o foro privilegiado é prerrogativa da função, independentemente do momento em que os fatos em apuração ocorreram.
(II) A segunda solução seria adotar o entendimento da vedação à fraude à lei. O Supremo teria que se posicionar sobre a nomeação de Lula para o Ministério, entendendo que se trata de uma tentativa de burla às normas processuais definidoras de competências – tanto do Judiciário como do Ministério Público – para definir que os procedimentos investigativos ou processos judiciais eventualmente em curso contra o ex-presidente devem prosseguir sob a condução dos promotores e juízes naturais dos casos. Eventual posicionamento do Supremo nessa linha não impediria a nomeação de Lula para o Ministério.
Com a decisão do Supremo Tribunal Federal de desmembrar o processo contra o deputado Eduardo Cunha, mandando para o Juiz Sérgio Moro os casos da mulher e da filha do presidente da Câmara, fica claro que Lula pode até ganhar foro privilegiado, mas Dona Mariza, seus filhos e noras serão julgados por Moro.