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Dentro da normalidade

 

Não foi dos mais exemplares o procedimento burocrático de prisão dos primeiros mensaleiros levados para a Penitenciária da Papuda em Brasília. Basta ver que os condenados com direito a prisão semi-aberta ficaram desnecessariamente em prisão de caráter fechado, pois no final da tarde de ontem foram removidos para o Centro de Internamento e Reeducação (CIR), que fica no próprio complexo da Papuda.

A medida não foi tomada antes por que faltava a carta de sentença no decreto de prisão assinado pelo presidente do STF, Joaquim Barbosa. Outra falha gritante foi a Polícia Federal ter deixado fugir, pela fronteira do Paraguai ao que tudo indica, o ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, que ajudou a desviar milhões do dinheiro público para o esquema do lobista Marcos Valério. Ele já havia dado sinais de que preparava algum esquema anteriormente, quando viajou para a Itália sem comunicar, já condenado pelo mensalão, embora sem a pena definida. Reapareceu para votar nas eleições municipais do ano passado e no endereço oficial em Copacabana, onde uma juíza não conseguira entregar-lhe uma intimação, continuava ausente. “Ele viaja muito”, dizem os vizinhos. Desta vez, não voltará mais.

Mas foram pequenos percalços, dos quais as defesas se aproveitaram para fazer um movimento ruidoso a favor de seus clientes, o que é perfeitamente compreensível. O caso do preso José Genoino foi o mais explorado politicamente.

Em nota oficial, o Departamento Penitenciário Nacional, subordinado ao Ministério da Justiça do governo petista, negou que o preso tenha tido qualquer ocorrência médica após dar entrada na Papuda. Parentes de Genoino chegaram a dizer que ele corria risco de morrer na cadeia, para reforçar o pedido de prisão domiciliar.

Acho até que o pedido seja justificável, pela situação de saúde de Genoino, mas o presidente do Supremo fez bem em pedir um laudo de médico do Estado para referendar eventual decisão. O caráter “provisório" da permanência dos presos em regime fechado foi atestado pelo Departamento Penitenciário, e eventuais benefícios terão que ser avaliados pelo juiz da execução penal do Distrito Federal.

Tudo nesse caso é novo e delicado. Mas a democracia brasileira está se saindo bem até o momento.

Mensalão e a República

Tem tudo a ver a decretação das primeiras prisões dos condenados pelo mensalão no dia 15 de Novembro, quando se comemorou a Proclamação da República. Ao formalizar o entendimento de que houve desvio de dinheiro público no caso, o plenário do Supremo Tribunal Federal, no 30 dia do julgamento, ouviu os melhores votos sobre a gravidade do ocorrido. O ministro Celso de Mello denunciou que essa prática, inaceitável, coloca em risco o equilíbrio entre os poderes da República: “O Estado brasileiro não tolera o poder que corrompe e nem admite o poder que se deixa corromper”.

Também o presidente da Corte, Carlos Ayres Britto, deu a dimensão da gravidade do esquema criminoso ao concordar que ele é representativo “de poder ideológico partidário”, acontecendo “mediante a arrecadação mais que ilícita, criminosa, de recursos públicos e privados para aliciar partidos políticos e corromper parlamentares e líderes partidários”. O voto de Celso de Mello enquadrou o objeto do julgamento na ótica da preservação da República. Ao votar a favor do crime de quadrilha, ele ampliou a interpretação, equiparando a “ameaça à paz social” feita pelos bandidos à insegurança provocada por “esses vergonhosos atos de corrupção parlamentares profundamente levianos quanto à dignidade e à respeitabilidade do Congresso Nacional”.

O Globo, 19/11/2013

O Globo, 19/11/2013