Mais uma manobra para atrapalhar o julgamento do mensalão acaba de ser superada pelo Supremo Tribunal Federal, que recusou retirar do processo Roberto Salgado, diretor do Banco Rural, utilizado no esquema dos mensaleiros.
Se a manobra do advogado Márcio Thomaz Bastos tivesse prevalecido, o argumento de que o banqueiro não tem foro privilegiado beneficiaria também réus como o ex-ministro José Dirceu, acusado pela Procuradoria Geral da República de ser o chefe da quadrilha do mensalão e que, por ter sido cassado, não tem mandato. Os processos voltariam à primeira instância da Justiça, e começariam do zero.
Outra manobra está em curso, com a tentativa de levar a imprensa tradicional a ser julgada pela CPI do Cachoeira, criando um clima político que favoreça a aprovação de uma legislação de controle da mídia, como sempre quiseram setores radicais do PT.
Ainda bem que o presidente do PT Rui Falcão é um trapalhão que antecipa as estratégias políticas em declarações açodadas, que servem para advertir a sociedade do que seu grupo político radical está tramando por baixo dos panos, contra a democracia.
Quando se transformou no primeiro petista a fazer uma ligação explícita entre a criação da CPI do Cachoeira e a tentativa de “melar” o julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal, Rui Falcão provocou irritação no ex-presidente Lula, que tramava a jogada política, mas não queria revelá- la antes do tempo, e da presidente Dilma Rousseff, que não queria saber de confusão no seu governo.
“A bancada do PT na Câmara e no Senado defende uma CPI para apurar esse escândalo dos autores da farsa do mensalão. É preciso que a sociedade organizada, movimentos populares, partidos políticos comprometidos com a luta contra a corrupção como é o PT se mobilizem para impedir a operação abafa e para desvendar todo o esquema montado por esses criminosos, falsos moralistas que se diziam defensores da moral e dos bons costumes”, conclamava Rui Falcão na ocasião, para ser desmentido por políticos de seu próprio partido, que tentaram disfarçar o fato que o presidente do PT tornou indesmentível: setores do petismo queriam usar a CPI do Cachoeira para pressionar o STF.
A primeira tentativa foi transformar a gravação do suborno de um diretor dos Correios em ação do grupo de Cachoeira, para atingir o então chefe da Casa Civil, José Dirceu.
Não deu certo, pois, mesmo que a gravação tenha sido feita a mando de Cachoeira, quem acusou Dirceu de comandar um esquema de corrupção dentro do Palácio do Planalto foi o então deputado Roberto Jefferson, acusação, aliás, que acabou sendo acolhida pela Procuradoria Geral da República.
O atual procurador, Roberto Gurgel, por sinal, caiu em desgraça com o PT quando apresentou a denúncia e por isso mesmo
está sendo ameaçado de convocação na CPI, embora seja inconstitucional tal convocação, pelo fato de que é ele quem deverá fazer a denúncia dos casos já levantados pela Polícia Federal envolvendo o senador Demóstenes Torres e outras autoridades com foro privilegiado.
O constrangimento da convocação provocou malestar entre os ministros do Supremo, que entenderam o gesto como uma afronta ao Judiciário.
A segunda trapalhada de Falcão veio em seguida, quando anunciou, como se fosse uma decisão de governo, que o próximo alvo seria a imprensa. Segundo suas palavras, “este é um governo que tem compromisso com o povo e que tem coragem para peitar um dos maiores conglomerados, dos mais poderosos do país, que é o sistema financeiro e bancário. E se prepara agora para um segundo grande desafio, que iremos nos deparar na campanha eleitoral, que é a apresentação para consulta pública do marco regulatório da comunicação”. E por que o governo faria isso? Segundo Rui Falcão, por pura vingança, pois a mídia “é um poder que contrasta com o nosso governo desde a subida do (ex-presidente) Lula, e não contrasta só com o projeto político e econômico. Contrasta com o atual preconceito, ao fazer uma campanha fundamentalista como foi a campanha contra a companheira Dilma (nas eleições presidenciais de 2010)”.
A própria presidente já mandou dizer por meio do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, que esse projeto de controle social da mídia não está em suas prioridades.
E, segundo ela, o único controle admissível é o controle remoto da televisão, com o qual cada cidadão é o juiz de sua decisão de ver este ou aquele canal.
O mesmo raciocínio vale para os jornais e revistas, que os cidadãos têm à disposição e compram ou deixam de comprar de acordo com sua vontade, e por razões pessoais. Este é o verdadeiro controle social da mídia numa democracia.
Por falar nisso, uma pesquisa da Associação de Jornais dos Estados Unidos (NAA, na sigla em inglês) mostrou mais uma vez que os jornais tradicionais são marcas confiáveis para as quais o leitor corre quando algo importante está acontecendo.
Pesquisas das universidades Stanford e Cornell, já mencionadas aqui na coluna, já mostravam que estava errada a tese de que as novas tecnologias, como a internet, os blogs, o Twitter e as redes sociais de comunicação, como o Facebook, seriam elementos de neutralização da grande imprensa.
Ao contrário, a internet seria como a “caixa de ressonância” da grande imprensa, de quem precisa para se suprir de informação e para dar credibilidade às informações.
Os sites e blogs mais acessados tanto nos EUA quanto no Brasil são aqueles que pertencem a companhias jornalísticas tradicionais, devido à credibilidade.
A pesquisa da NAA sobre o uso de multiplataformas mostra que ¾ de todos os usuários da internet têm os jornais como principal fonte de notícias e os leem em várias plataformas.
O Globo, 9/5/2012