O Congresso entrou em clima de anistia. O novo projeto de lei sobre o Caixa 2 eleitoral, inserido nas diversas medidas de combate à corrupção em debate na Câmara, anistiará, direta ou indiretamente, políticos que usaram dinheiro não contabilizado (lembram-se do Delúbio Soares?) nas suas campanhas, desde, é claro, que a origem seja lícita.
Na nova lei de repatriação de dinheiro que está no exterior, em paraísos fiscais ou não, sem ter sido declarado à Receita, o Senado proporá uma ampliação das garantias legais, se possível uma anistia explícita para dar maior “segurança jurídica” a quem aderir ao programa.
O secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, em entrevista ontem ao Globo, foi claro ao dizer que a partir da vigência do acordo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), vai ficar muito mais fácil alcançar dinheiro não declarado no exterior. “A era do sigilo bancário acabou”, comemorou Rachid.
Por isso, a nova rodada de repatriação deve conter uma garantia expressa de que os que aderirem ao programa ficarão anistiados, para impedir que a Receita use as informações dos processos de repatriação para investigar os que aderiram a ele.
Com relação ao Caixa 2 eleitoral, o que a nova redação fará ao criminalizar a ação explicitamente é dar um argumento jurídico aos que forem denunciados pela prática após a promulgação da lei, partindo do pressuposto de que não era um crime tipificado anteriormente.
Há uma discussão jurídica a respeito, pois diversas leis tratam do Caixa 2 como crime, desde o Código Eleitoral até o Código Penal quando trata do crime de falsidade ideológica, e a Lei das Eleições, que manda para o Ministério Público Eleitoral os processos “para fins de ação penal”. Mesmo assim, há discussão sobre a natureza desse crime e até saída jurídicas.
Partindo do pressuposto de que caixa dois é crime previsto no artigo 350 do Código Eleitoral, uma lei que crie um tipo especial, com penas mais severas, não afastará a incidência daquele dispositivo sobre os fatos ocorridos anteriormente, na visão de muitos advogados.
Trata-se da extra-atividade da lei revogada, que se dá quando a lei nova não descriminaliza a conduta, só agravando a pena, não podendo retroagir. Como o artigo 350 do Código Eleitoral não diz qual é a pena mínima, só a máxima de 5 anos de reclusão, seria possível usar o artigo 284, que esclarece: "Sempre que este Código não indicar o grau mínimo, entende-se que ele será de 15(quinze) dias para a pena de detenção e de 1 (um) ano para a pena de reclusão".
Por conta dessa pena mínima, para os fatos ocorridos antes da entrada em vigor da lei nova, poderá ter aplicação o artigo 89 da lei 9.099, de 26 de setembro de 1995: "Nos crimes em que a pena mínima for igual ou inferior a 1(um) anos, abrangidas ou não por esta lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia poderá propor a suspensão do processo, por 2(dois) a 4(quatro) anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizam a suspensão condicional da pena (artigo 77 do Código Penal)”.
Os que forem acusados de Caixa 2 terão então vasta munição para discutir na Justiça sua condição. Na definição de um advogado, haverá uma fuzilaria entre a defesa e o Ministério Público, se este não propuser a suspensão do processo - preenchidos os requisitos legais.