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Tanto gasto para quê?

 

No dia em que a Câmara dos Deputados livrava Temer da segunda denúncia da Procuradoria-Geral, uma pesquisa internacional revelava que o presidente brasileiro era o mais impopular do mundo, um título que vem se juntar ao de mais rejeitado da nossa história. Sua avaliação popular é inversamente proporcional ao apoio parlamentar, ou seja, as ruas não se reconhecem nos seus representantes, como aconteceu na última quarta-feira, quando ele escapou de mais uma denúncia, num espetáculo que fez corar quem acompanhou pela TV. Os eleitores de Temer, na sua maioria, mandaram às favas todos os escrúpulos.

E mesmo assim, considerando a relação custo-benefício, não foi um bom negócio: o presidente gastou muito mais do que recebeu. Foram cerca de R$ 12 bilhões em liberação de emendas, perdão de dívidas, benesses, vantagens devidas e indevidas, uma orgia. A quem achasse demais, ele poderia dizer: “o dinheiro não é meu”. E teria razão (cínica), o dinheiro é nosso. A repórter Cristiane Jungblut fez as contas. Por pressão do ex-deputado Valdemar Costa Neto, condenado pelo mensalão a mais de sete anos de prisão, o presidente desistiu dos R$ 6 bilhões que obteria com a privatização do aeroporto de Congonhas. Só com o decreto concedendo 60% de descontos nas multas ambientais não pagas, a perda de receita foi de R$ 2,8 bilhões. Com concessões no Refis, foram R$ 2,4 bilhões. Com emendas, R$ 800 milhões. 

Se depois de uma vitória tão apertada Temer achava que não teria mais dor de cabeça com os pagamentos, estava enganado. Surgiram novos pedidos e cobranças dos partidos da base aliada que, por exemplo, não acham justo que o PSDB, com quatro ministérios, tenha dado mais votos contra o presidente do que a favor. A principal reclamação do Centrão é em relação ao ministro da Secretaria de Governo, Antônio Imbassahy, que ocupa um dos cargos mais cobiçados do governo. A insatisfação é tão grande que muitos parlamentares se negavam a despachar com ele, que acabou sendo substituído na prática pelo ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha. 

Ao se livrar das acusações, Michel Temer pode ter conseguido uma sobrevida política até 2018. Ou não. Parece haver consenso entre os analistas políticos de que é uma caminhada penosa para um presidente desgastado, enfraquecido, sem condições de realizar as reformas que prometeu, principalmente a da Previdência. A previsão é que, para ser aprovada, ela terá que ser desfigurada. O presidente do Senado já avisou que “o momento não é oportuno”; e o da Câmara quer dar urgência ao projeto de abuso de autoridade. 

Portanto, há o risco de Temer chegar às eleições sem poder fazer nem o sucessor. Quem se arriscará a associar seu nome ao dele?

O Globo, 28/10/2017