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Sinais

 

"Caio verticalmente e me transformo em notícia." Foi assim que o poeta Carlos Drummond de Andrade terminou o poema "Morte no Avião", publicado no livro "A Rosa do Povo", em 1945. Ele viajava pouco, foi uma vez à Argentina para visitar a filha Julieta e os netos, evitava os aviões, mas, como todos os mineiros, gostava de trens e aceitava carros.

Morava na rua Conselheiro Lafayete e eu na Raul Pompéia, ambas em Copacabana. Trabalhávamos no "Correio da Manhã", na rua Gomes Freire, no centro. Vez ou outra dava-lhe carona no meu Simca Chambord, ele sempre elogiava o carro e o meu modo de dirigir.

No poema, ele descreve com minúcias o cidadão que acorda, toma banho, escova os dentes, faz a barba, veste-se, chega no aeroporto, faz o check-in, embarca, e cumpre com discrição um tipo de superstição particular se for religioso, uma jaculatória. O avião decola, ele olha a paisagem. Aí o avião cai e ele se transforma em notícia. Sendo quem é, com o merecido destaque, além da biografia resumida e sua bibliografia.

Outro mineiro famoso, Otto Lara Resende, estava indo a Belo Horizonte. Na altura da avenida Brasil, ele viu um enorme caminhão tendo na caçamba um motor de avião, meio desmontado e sujo de terra.

O Paulo Coelho diz, em quase todos os seus livros, que é necessário compreender os "sinais". Acho que o Otto nunca leu o Paulo, mas era perito em dar importância aos sinais. Evidente que mandou o táxi dar meia-volta e foi para casa. Aliviado e vivo.

Tenho por hábito ler as três letras que identificam cada avião. Ia voar num aparelho sinistramente registrado como VVC. Fiz uma leitura trágica: "Vai virar cadáver". Já estava disposto a sair da fila e voltar para casa. Mas logo fiz nova leitura: "Vai viajar, covarde".

Folha de S. Paulo (RJ), 17/08/2014