O senador Cristovam Buarque, que marca sua atuação na política brasileira pela defesa da melhoria da educação, tendo ficado conhecido como o candidato "de uma nota só" - coisa que muito o orgulha, aliás - quando se apresentou na disputa pela Presidência da República em 2006, tem uma nova utopia: a ampliação da rede de escolas públicas federais, hoje com cerca de 300 unidades (Pedro II, escolas técnicas, colégios militares, institutos de aplicação).
Elas estão entre as melhores do país, com média melhor do que a das escolas particulares, ao contrário das escolas públicas municipais e estaduais, que estão entre as de mais baixo nível educacional de acordo com o mais recente Enem.
Um fato que gera entusiasmo, ressalta o senador, é ver os resultados das recentes olimpíadas de matemática e, em especial, o desempenho dos alunos das escolas federais. As 300 federais têm a melhor média do Ideb entre todos os segmentos da educação de base.
Ele entregou à ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil) uma proposta para federalizar a educação no Brasil em um prazo de algumas décadas, ao mesmo tempo em que se melhorariam as escolas municipais e estaduais, durante o processo de substituição do sistema vigente pelo novo sistema federal.
A proposta, que ele chama de Revolução Republicana na Educação, consiste em levar, com qualidade ampliada, essas 300 escolas a todo o território nacional em 20 anos.
"A História nos dá a chance de sermos líderes da construção desse novo Brasil. Os "Cieps do Brizola" falharam ao focar na unidade escolar e na arquitetura, e não na cidade inteira: nos professores, no conteúdo e nos equipamentos", analisa o senador do PDT.
Ao trocar o enfoque na escola por enfoque na cidade, o projeto levará a uma inflexão da educação brasileira, da simples evolução para uma revolução, aposta Buarque.
Os dois movimentos propostos são: (a) fazer uma revolução em cidades pré-escolhidas, as Cidades com Escola Básica Ideal (Cebi); e (b) avançar na qualidade de todo o Sistema Educacional Vigente (SEV).
Todas as escolas do país seriam melhoradas ao mesmo tempo em que todas as escolas de determinadas cidades sofreriam radical revolução: teriam seus professores selecionados pelo governo federal, com carreira nacional; com salários atraentes, com regime especial de formação e exigências específicas de dedicação; os prédios seriam reconstruídos e receberiam os mais modernos equipamentos pedagógicos; todas as crianças teriam ao menos seis horas/dia de atividade escolar.
O senador ressalta que o resultado seria que, de imediato, o ensino nessas cidades teria a qualidade dos países mais avançados. Ele estima que em um período de cerca de 20 anos, as Cebis poderiam chegar a todo o território nacional.
As cidades seriam escolhidas com base em critérios como: (i) tamanho - cidades de porte pequeno; (ii) História - cidades com alguma tradição educacional; (iii) compromisso - cidades cujos prefeitos e governadores apresentem história de compromisso com a educação e vontade de participar do financiamento dessa Revolução Educacional.
A proposta supõe, no primeiro ano, atender 3,5 milhões de crianças em 200 cidades pré-selecionadas, com população média de 70 mil habitantes, a um custo de R$9 mil por aluno, e custo total de R$40,3 bilhões.
Nesse custo, ressalta o estudo do senador, está incluído o salário da carreira nacional de R$9 mil/mês - equivalente ao salário pago em países como Coreia do Sul, Finlândia e Chile - para 120 mil novos professores, além do custo da nova infraestrutura de ponta associada ao ensino de qualidade.
Também os salários dos professores do SEV seriam aumentados, passando dos atuais R$1.527 para R$4.000, com um novo regime de formação e dedicação e gastos com infraestrutura capazes de disseminar o horário integral em todas as cidades, a um custo adicional de R$118,7 bilhões.
Nos anos posteriores ocorreria a ampliação das Cebis, substituindo a cobertura do SEV até a revolução chegar a todas as cidades, todas as escolas, todas as crianças do Brasil.
Na medida em que aumentam o número de alunos e o custo para as Cebis, o sistema tradicional iria sendo encolhido, até zerar.
O custo da Revolução Republicana na Educação, daqui a 20 anos - no seu último ano de implementação, quando todo o novo sistema de educação básica tiver substituído o sistema tradicional vigente -, será de 6,4% do PIB, assumindo o crescimento do PIB em 3% ao ano nesse período, o que Buarque considera "conservador".
Descontando os gastos atuais com a educação de base (3,04% do PIB), o custo líquido da revolução será de 3,36% do PIB. O custo total dessa revolução (incluindo os gastos com o ensino superior) seria de apenas 7,1% do PIB, "perfeitamente dentro das possibilidades da economia brasileira", na avaliação de Buarque.
O peso dos custos será bastante menor ao longo dos anos, ressalta o senador, se levarmos em conta o impacto da educação sobre a taxa de crescimento do PIB, como também a redução quase automática nos custos dos programas sociais.
"Nossa evolução é mais lenta do que o aumento nas exigências, e a consequência é o aumento na brecha educacional que hoje caracteriza um verdadeiro apagão intelectual, em um país que tem a 7ª economia mundial", adverte o senador.
Para ele, "quando a educação é distribuída desigualmente, ela termina sendo o berço da desigualdade".
Por isso, a continuidade de um Brasil "democrático, justo, eficiente, com presença internacional vai depender de um salto na educação brasileira, como fizeram no passado os países hoje desenvolvidos e países como Coreia do Sul, Irlanda, Espanha, Cingapura e outros que, há poucos anos, estavam atrás do Brasil e hoje nos superam, em muito, na renda per capita, na equidade, na produção de bens de alta tecnologia".
O Globo, 22/9/2011