O resultado do primeiro turno da eleição para presidência da Câmara mostrou o fortalecimento do governo Temer, que teve apoio dos dois finalistas, e a derrota de Lula, marcando que o PT está mesmo em minoria no Congresso.
Fora os diversos Severinos que se apresentaram como candidatos apenas para terem seus dez minutos de fama, houve uma boa surpresa nos discursos de deputados mais influentes na Câmara: o reconhecimento de que é preciso resgatar a credibilidade dos políticos diante da sociedade brasileira.
O mandato que tantos cobiçaram terá apenas seis meses, mas é nesse intervalo até a próxima legislatura, com mandato de dois anos, que poderão ser dados os primeiros passos para o restabelecimento da imagem da Câmara, que todos destacaram ser a face mais visível do Congresso, aquela que deveria representar os cidadãos.
Esse estado de espírito combina com o que está acontecendo na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, onde são poucos os que se atrevem a defender o deputado Eduardo Cunha, e muitos são os que, mesmo sob a vigilância dele, dispõem-se a enfrentá-lo, com palavras e votos.
Cunha, sem dúvida, continua com capacidade de atuação nos bastidores, tanto que conseguiu transferir para hoje a votação que confirmará sua ida a julgamento no plenário da Câmara.
Teve sorte, porém, ao enfrentar nessa guerra regimental um atabalhoado vice-presidente em exercício, Waldir Maranhão, que tentou adiar a votação para a presidência da Câmara a fim de dar tempo à CCJ de terminar o serviço ainda ontem.
Mas, fraco, Maranhão foi e voltou de sua decisão várias vezes, deixando claras suas intenções políticas, o que permitiu ao deputado Osmar Serraglio, aliado de Cunha, adiar a sessão, dando mais uma noite ao condenado inapelavelmente à degola pelo plenário.
Cunha tornou-se o exemplo a ser dado pela Câmara à sociedade, e nem mesmo sua ameaça de que os demais deputados terão o mesmo destino que ele, se a cassação acontecer, amedrontou a maioria. Ninguém quer demonstrar que se considera igual a ele. Mesmo que seja, mesmo que Cunha saiba que é.
Mas o espírito que domina a CCJ e o plenário é o mesmo revelado em diversos discursos dos candidatos, a necessidade de reverter a imagem negativa que o Congresso tem diante do eleitorado, e até mesmo uma pesquisa que mostra que 90% dos eleitores não se consideram representados no Congresso foi citada como sinal de que as coisas chegaram a um ponto insustentável, e que é preciso fazer alguma coisa para recuperar a confiança dos brasileiros.
Admitir que estamos em uma crise política sem igual, e que, se nada for feito para superá-la, todos naufragarão juntos, é um primeiro passo para a busca de uma solução. Não seria surpresa se, deste caos em que a política brasileira está metida, saísse um projeto de reforma política que desse uma organização básica à atuação do Congresso.
O número exagerado de candidatos que se apresentaram para a presidência da Câmara é uma consequência do sistema partidário sem limitações mínimas para que partidos sejam representados no Congresso.
O governo Temer, que teve uma quase unanimidade de apoio nos discursos, tem uma proposta de reforma política minimalista que pode ser um bom início, baseado em dois pontos fundamentais: cláusulas de barreira e fim das coligações proporcionais.
É sinal de que, na Câmara, o questionamento ao governo Temer não encontra eco o fato de que não tenha havido candidato, fora dos tradicionais aliados do PT, que se colocasse contra o governo.
A maioria está sintonizada com a necessidade de recuperar a governabilidade perdida nos anos Dilma Rousseff, especialmente nos últimos meses, em que o Congresso estava em pé de guerra com o Planalto.
O Globo, 14/07/2016