Muito além das questões econômicas envolvidas na redistribuição dos royalties do petróleo, com a ameaça de comprometer projetos já em andamento e planejamentos de longo prazo dos governos dos estados produtores, especialmente os dois maiores, Rio de Janeiro e Espírito Santo, um estudo do economista José Roberto Afonso, elaborado a pedido dos senadores Francisco Dornelles e Lindbergh Farias, que contou com o apoio da Secretaria de Estado de Fazenda do Rio de Janeiro, demonstra como essa maneira de redistribuir as receitas entre os governos estaduais, obedecendo a uma “ditadura da maioria”, distorce a visão de conjunto, e até de nação.
O estudo classifica de “preocupantes” para a Federação brasileira as implicações do projeto de lei que está nas mãos da presidente Dilma, particularmente pela forma como foi aprovado no Congresso Nacional. Além das questões políticas e jurídicas envolvidas na redistribuição das receitas das participações governamentais em petróleo das concessões já realizadas no passado, “em produção e recolhimento corrente”, os precedentes abertos são graves, adverte o estudo de José Roberto Afonso, e representam mais uma razão para que a presidente Dilma vete o projeto aprovado pelo Congresso, em parte ou no seu todo.
“Nada garante que essa visão simplória de Federação se limitaria a redistribuir receitas de petróleo”, adverte o economista, para quem “pode se tornar perigosa a noção de que a Federação numa democracia deve considerar e atender apenas aos interesses da maioria. É perdida a noção do conjunto. O caso a caso se torna um atalho para o casuísmo, para a perda de noção de um conjunto. Os interesses imediatistas se sobrepuseram a uma lógica estratégica ou de longo prazo”.
O mesmo sistema pode vir a ser usado em uma disputa futura de receitas públicas travadas pontualmente, e, mais grave, tal disputa pode se limitar ao campo da redistribuição horizontal, “um ente tentando tirar de outro ente do mesmo nível de governo, de modo que seja quase inevitável que, indo a voto, a maioria venha a extrair um ganho para si a custa de outro governo da mesma esfera”.
José Roberto Afonso chama a atenção para o fato de que no caso dos royalties “a redistribuição é vista como solução, ou mesmo panaceia, para a perda de dinamismo dos repasses dos fundos de participação, que nada têm a ver com as receitas de participações em petróleo e nem com o comportamento dos governos que podem vir a perdê-las, mas sim com a conjuntura econômica desfavorável e, sobretudo, a política tributária federal, que privilegia o aumento da carga de tributos não compartilhados e concentra a concessão de benefícios nos impostos repartidos”.
Ao invés de enfrentar as verdadeiras causas do problema e eventualmente contrariar as autoridades do governo central, “os parlamentares que pregam a necessidade de fortalecer os governos estaduais e municipais dependentes dos fundos de participação preferiram retirar receitas atualmente já entregues aos governos congêneres”, espanta-se José Roberto, para quem se tornou “uma questão menor ”alterar a forma de divisão de futuras concessões e receitas.
A proposta do Executivo Federal que previa redistribuir apenas a receita futura a que seria arrecadada apenas dos campos licitados depois de promulgada a nova lei “foi completamente abandonada”, lembra José Roberto Afonso, quando ficou claro que a produção e a consequente receita governamental a ser extraída da maioria dos campos do pré-sal “ainda levarão anos, talvez décadas, para serem concretizadas, uma vez que exigem investimentos pesados e de larga maturação, muitos que sequer começaram”.