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Por baixo dos panos

 

É provável que seja apresentado amanhã um projeto de lei criminalizando o Caixa 2 nas campanhas eleitorais, com o apoio de todas as legendas atuantes no Congresso, com a possível exceção do PSOL e da Rede.

A base do projeto é a medida 8 de combate à corrupção apresentada pelo Ministério Público de Curitiba sob o título “Responsabilização dos partidos políticos e criminalização do caixa 2”. Há duas versões do texto: uma que anistia explicitamente todos os crimes eleitorais cometidos anteriormente; e uma segunda, que tem mais chance de ter o consenso, que criminaliza o Caixa 2 para encerrar a discussão sobre se esse financiamento por fora da legislação eleitoral é ou não crime passível de punição mais rigorosa.

Os deputados consideram que não há clima político para uma anistia explícita, e estão em busca de um texto que represente uma espécie de “anistia moral” quando as delações premiadas das empreiteiras OAS e Odebrecht listem cerca de 100 parlamentares, de praticamente todos os partidos, que receberam financiamentos legalmente ou no Caixa 2.

Como consideram que será difícil separar o joio do trigo, os parlamentares querem especificar na nova lei o que é Caixa 2 para financiamento de campanha, separando do que seja propina, para fins pessoais ou do partido. Na verdade, o objetivo da medida é livrar os parlamentares da acusação de primeira instância, pois eles consideram que os Procuradores de Curitiba e o próprio Juiz Sérgio Moro criminalizam a política.

Também se preocupam com a chegada da ministra Carmem Lucia à presidência do STF. Conhecida por sua severidade, a ministra disse, em 2012, no julgamento do mensalão, o seguinte: “Acho estranho e muito grave que alguém diga, com toda tranquilidade, que ‘ora, houve caixa dois’ na tribuna do tribunal supremo do país como se fosse algo banal, tranquilo, que se afirma com singeleza. Caixa dois é crime; caixa dois é uma agressão à sociedade brasileira; caixa dois compromete, mesmo que tivesse sido isso, ou só isso; e isso não é só; e isso não é pouco! E dizer isto da tribuna do Supremo Tribunal, ou perante qualquer juiz, parece-me, realmente, grave, porque fica parecendo que ilícito no Brasil pode ser praticado, confessado e tudo bem. E não é tudo bem, tudo bem é estar num país, num Estado de Direito, quando todo mundo cumpre a lei”.

Há na Justiça Eleitoral uma disputa de entendimentos sobre se o Caixa 2 é crime, ou apenas uma infração eleitoral. No artigo 350 do Código Eleitoral está dito que é crime “Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”.

Muitos juízes interpretam esse texto como a definição do crime do Caixa 2, mas outros consideram que não está tipificado aí o crime. Se o Congresso aprovar um projeto de lei sobre o assunto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai ter que se definir sobre a questão, e é o que os parlamentares querem, pois a partir da nova lei, a punição não poderá retroceder.

A discussão sobre se o Caixa 2 é crime ou não tem base no Artigo 1º do Código Penal, segundo o qual “Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”. Se vencerem o debate sobre o artigo 350 do Código Eleitoral, os parlamentares estarão protegidos sem nem mesmo precisarem explicitar uma anistia.

Mas ficarão suspeitos de estarem agindo para proteção mútua, conforme conversa gravada do senador Romero Jucá com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado:  

Machado

Rapaz, a solução mais fácil era botar o Michel (Temer).

Jucá

(concordando) Só o Renan que está contra essa p****. Porque não gosta do Michel, porque o Michel é Eduardo Cunha. Gente, esquece o Eduardo Cunha, o Eduardo Cunha está morto, p****.

Machado

É um acordo, botar o Michel, num grande acordo nacional.

Jucá

Com o Supremo, com tudo.

Machado 

Com tudo, aí parava tudo.

Jucá 

É. Delimitava onde está, pronto.

Machado

Parava tudo. Ou faz isso... 

 
O Globo, 18/09/2016