Há alguns anos, participei, em Querétaro, no México, de uma reunião de ex-presidentes para fazermos uma reflexão sobre os problemas do futuro da humanidade. Nossa visão era a de que o final da Guerra Fria, com a queda do Muro de Berlim, abria um horizonte de um grande e definitivo período de paz em termos globais, embora permanecessem os conflitos regionais, muitos deles graves e desestabilizadores.
Então, arrolamos alguns dos problemas que necessitam de uma gerência mundial, feita pelas Nações Unidas, se esta já tivesse alcançado um estágio de poder que fizesse suas decisões obedecidas ou ela respeitada como instituição reguladora das relações internacionais.
Os Estados Unidos, surgindo então como única e incontrastável potência mundial, logo estabeleceram suas diretrizes para o mundo unipolar. A primeira delas foi a de que acima de qualquer interesse global prevalecia o interesse particular daquele país. Isso, diante da fragilidade da ONU e da inexistência de contestação ao poder americano, na prática dava a estes o gerenciamento dos problemas do futuro da humanidade. Isso, de certo modo, tinha um lado positivo. Alguns desses problemas necessitavam de vigilância impostergável.
Quais seriam estes problemas? Primeiro, a proliferação de armas nucleares. Não havia maior perigo imediato do que a anarquia nesse setor. Os países que dominavam a tecnologia passaram a ser membros de um clube fechado. O Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares seria assinado por todos os outros países do mundo, sujeitos a controle e fiscalização. Realmente, enquanto existir uma ogiva nuclear na face da Terra a humanidade estará em perigo. Outro problema era o dos vetores, isto é, dos foguetes que transportam essa armas e que completam o ciclo da ameaça nuclear. A seguir armas químicas e biológicas, meio ambiente, efeito estufa, crime organizado, terrorismo, narcotráfico, pandemias e doenças desconhecidas. Qualquer desses itens pode ameaçar a sobrevivência da humanidade.
Ora, esta última era "last but not least". Uma das formas de extinção do gênero humano, que vive de mutações através das eras, poderia ocorrer no nosso DNA, no código genético, o que é uma das preocupações dos cientistas que olham as estrelas e o tempo futuro.
Das doenças desconhecidas, muitas aparecem e necessitam de uma mobilização em nível mundial. A maior delas foi a Aids, que junta o amor e a morte na sua origem por sua transmissão durante o ato de procriar.
Agora, estamos enfrentando a gripe aviária. É grave e nos dá seu primeiro impacto na imagem dos cisnes mortos. O perigo está, dizem os especialistas, numa mutação viral que faça com que o vírus se transmita de pessoa a pessoa, o que seria uma tragédia para o mundo, certamente com a dizimação de milhões de pessoas.
Isso vem demonstrar o ponto central do destino humano. Estamos condenados a viver juntos e a juntos enfrentarmos os perigos. Melhor seria que juntos desfrutássemos todos da riqueza. O caminho do futuro é o da solidariedade.
Como se diz na cerimônia litúrgica do casamento, "na saúde e na doença, na alegria e na tristeza" e, como acrescenta o padre Hélio, do Maranhão, numa versão popular, "na farinha e no peixe frito, na ponta da faca e no foguete".
Que o frango nos ajude a juntos fugir da morte e desfrutar da vida.
Folha de São Paulo (São Paulo) 10/03/2006