O país virou uma grande ópera bufa, que não termina em tragédia, mas pode se transformar, como aconteceu com o gênero do século XVIII, que começou como um mero entretenimento no intervalo das óperas sérias e acabou ganhando autonomia.
Temos que torcer para que o governo Bolsonaro seja apenas o intervalo, o mais curto possível, que nos levará, aos trancos e barrancos, à peça principal. Os personagens cômicos da ópera bufa sempre existiram, mas saíram do baixo clero para o proscênio nessa quadra de pandemia e pandemônio.
Os militares que abundam na estrutura burocrática de nosso serviço público acabam levando ladeira abaixo o prestígio das Forças Armadas que, inertes, não reagem a essa corrosão de imagem que já é registrada em pesquisas de opinião. Por falar nelas, quando, em um país sério, a possibilidade de um golpe militar se transformaria em conversa de botequim (quando os botequins estavam abertos) ?
Ou serviria para dar um ar de seriedade a uma militância de extrema-direita mais cênica do que real, mas nem por isso tolerável e menos perigosa, acampada sob a denominação genérica de 300 ? O nome vem do filme baseado em uma história em quadrinhos de Frank Miller, com o brasileiro Rodrigo Santoro no papel do rei persa Xerxes. Classificado como propagador da violência militar e da eugenia, o filme ficou marcado como de extrema-direita, o que justifica o nome do grupo de Sara Giromini, dita Winter, que nem chega perto dos 300 de Esparta na Batalha das Termópilas.
São alguns gatos pingados estimulados pela retórica agressiva do governo Bolsonaro, sendo o próprio presidente um propagandista do grupo. Na falta de material humano suficiente para tornar realidade suas bravatas, sobra à terrorista visão marqueteira para impressionar a opinião pública. Desde encenar na frente do Supremo Tribunal Federal uma patética mimetizacão da Klu Klux Klan, com seus capuzes e tochas acessas, outro símbolo da direita selvagem, até atacar o (STF) com fogos de artifício.
Foi tardiamente presa, menos pelo que pode fazer do que pelo simbolismo de suas ações midiáticas. Como se estivéssemos em uma ópera bufa, o cavaleiro glorioso não passa de um mau soldado seguido por uma vivandeira de quinta categoria. Ambos tornam vexaminosos os enredos em que se metem, e levam junto consigo a credibilidade das Forças Armadas. Pelo menos enquanto os militares que o cercam não forem desautorizados de representarem o Exército no apoio às loucuras de Bolsonero, como o apelidou a revista inglesa The Economist, representante maior do liberalismo econômico, e não um panfleto comunista.
O vice-presidente Hamilton Mourão, que tem o hábito de escrever e declarar uma coisa e depois explicar com seu oposto, disse que Bolsonaro não conta com as Forças Armadas para um autogolpe: “ (...) ele sabe que as Forças Armadas não o acompanharão em uma aventura dessa natureza. É isso que ele quis dizer”.
A exegese de Mourão seria importante se não estivesse banalizada pela sua própria incoerência, assim como o golpe militar está tão vulgarizado que já se tornou uma paródia de si mesmo. Está claro há muito tempo que é preciso desbaratar a rede que financia fake news, ataques à democracia e manifestações como as que foram feitas em frente ao Palácio do Planalto e ao QG do Exército.
É uma turma que trabalha com a intenção de pressionar o STF, o Congresso e outras instituições e nunca recebeu qualquer crítica do presidente Bolsonaro. E essa investigação vai acabar conectada ao inquérito das fake news no STF e do financiamento ilegal na campanha presidencial de 2018 que corre no TSE.
Nesse novo mundo pós-pandemia, o Brasil tornou-se um pária entre as nações ocidentais. Um país que, por incúria e negligência de um governante insano, se colocou no ranking dos mais atingidos pela pandemia, levando a que fronteiras sejam fechadas à sua gente e a seus produtos, já atingidos pela péssima fama das políticas ambientais do governo.