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O risco de saturar

 

Pode-se alegar que a Operação Mãos Limpas, na Itália, demorou três anos e funcionou. O problema é que o brasileiro é mais impaciente, a não ser com novelas.

Nos últimos 16 meses, o país vem assistindo a uma espécie de maxissérie política que tem apresentado cenas e personagens inesperados, mas que talvez esteja se prolongando demais, com risco de vir a cansar o público.

Toda narrativa dramática precisa ter suspense e clímax para prender a atenção e funcionar bem. Quando isso não ocorre, por falta ou por repetição, há perda de interesse, o que pode estar acontecendo com a Operação Lava-Jato, que já se encontra no seu 15º capítulo, ou fase.

É um trabalho de profilaxia moral indispensável, mas que reitera o mesmo tema, a corrupção. A um escândalo noticiado sucede outro, que em seguida é superado por um episódio parecido e assim por diante, numa sequência de “déjà vu” que, com o tempo, ameaça produzir uma certa saturação e anestesia no nosso sistema de indignação.

Pela banalização, os escândalos deixam de escandalizar. Me lembro que o primeiro choque foi quando Pedro Barusco, um gerentezinho da Petrobras, se dispôs a devolver US$ 97 milhões que recebera de propina. Hoje, os desvios chegam a bilhões. Ontem, anunciou-se que o lobista Fernando Baiano usava uma rede de 19 contas no exterior. Amanhã, talvez surja mais um com o dobro.

Pode-se alegar que a Operação Mãos Limpas, na Itália, demorou três anos e funcionou. O problema é que o brasileiro é mais impaciente, a não ser com novelas, que sabem renovar as emoções para não perder ponto no Ibope.

É claro que no folhetim o autor tem liberdade para encurtar enredo, modificar a trama, matar personagem, transformar vilão em mocinho. Na Lava-Jato, o máximo que pode o juiz, espécie de autor-diretor, é condenar e mandar prender, respeitando os ritos e jamais atropelando as provas.

Já se ouvem, porém, queixas na rua quanto à morosidade do processo. Como escreveu o presidente do Instituto de Estudos do Desenvolvimento Industrial, Pedro Luiz Passos, “sem solução do imbróglio político em que o país se meteu, a economia não voltará a crescer".

Há uma ansiedade para saber quem no “imbróglio” é de fato culpado e quem vai ser inocentado Dos 50 envolvidos, pelo menos sete já foram condenados. Mas entre os restantes, há deputados, senadores, ex e atuais governadores, presidentes da Câmara e do Senado, empresários, lobistas. Quais serão os que vão para a prisão, não apenas provisoriamente por semanas ou meses, mas definitivamente, esgotados os recursos legais?

Essa história precisa urgente de um clímax, sem prejuízo da apuração para punir ou absolver. Não é justo deixar no ar dúvidas e suspeitas sobre dirigentes e ex-dirigentes.

O Globo, 25/07/2015