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O que desejar em 2008

 

O PADRE IVES D'Evreux escreveu um livro, "Voyage au Nord du Brésil" (1615), que se escondeu durante 220 anos, num único exemplar, que tinha sido oferecido a Luís 13, e dormia desconhecido na Biblioteca de Paris, onde foi descoberto por Ferdinand Denis em 1835. Recentemente, apareceu um outro exemplar da obra na New York University.


É um livro fascinante, em que ele descreve, pela primeira vez, como os índios brasileiros viam o cosmo, com seus luzeiros, a Lua, o Sol e as estrelas, às quais davam nome e orientavam-nos. Eles não tinham noção do tempo, e tudo era o fascínio da eternidade. Os dias eram contados pelas luas, que, num sistema complicado, revelavam o tempo das chuvas e das colheitas.


Na passagem deste ano para o próximo, lembrei-me da felicidade deles sem a parafernália das festas de celebração e a solidão da inocência de desconhecer o tempo que nós criamos para datar a vida e, às vezes, dar dor de cabeça.


Quando Júlio César tomou o poder em Roma, em 101 antes de Cristo, encontrou uma confusão danada sobre datas e tentou fazer um calendário, que tomou o nome de Juliano, no qual, para acertar as contas da rotação da Terra ao redor do Sol, criou mais um dia em fevereiro. Mas fevereiro era um mês considerado agourento.


Então esse dia passou a ser chamado "dois dias antes de começar março", em latim: "bis sextus calendas martias". Mas não resolveu nada, a confusão perdurava e as coisas não fechavam. Isso só aconteceu com o calendário Gregoriano, adotado até hoje, que colocou os 29 de fevereiro de quatro em quatro anos, com o velho nome Juliano de bissexto para esses anos.


Nós, que já não somos índios nem romanos, descobrimos o tempo e, assim, contar não só as nossas vidas mas até a vida da Terra. Então vamos abraçar os amigos.


Eu, particularmente, quero abraçar meus leitores -perdi um em 2007, a quem queria muito bem, Octavio Frias-, mandar meus votos de felicidades e pedir emprestado o pensamento dos outros para completar o meu.


Então vou ao "Velho Testamento" para saber o que Deus desejou de melhor a alguém que amava. E invoco sua bênção a Salomão. Que mensagem lhe deu? Sabedoria. Não essa palavra com tantos significados, até mesmo o da esperteza.


Mas a Sabedoria transcendental, aquela que traz saúde, paz e prosperidade e faz distinguir o bem do mal, o amor do desamor, a retidão do erro.


Saúde, paz, alegria de viver. Bons Anos, como dizia o padre Vieira.


Folha de S. Paulo (SP) 28/12/2007

Folha de S. Paulo (SP), 28/12/2007