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O novo e o velho

 

Pode-se dizer que no confronto entre o velho e o novo, entre o moderno e o arcaico, as mobilizações dos movimentos sociais perderam a hegemonia das ruas para as convocadas pelas redes sociais. De acordo com parâmetros anteriores às manifestações do mês passado, o Dia Nacional de Lutas convocado por entidades como as centrais sindicais , a UNE e o MST, com pauta centrada em questões trabalhistas - contra o fator previdenciário, a terceirização, pela  jornada de trabalho de 40 horas semanais -, até que poderia ser considerado exitoso.

Afinal, manifestantes interditaram diversas rodovias e bloquearam acessos aos portos de Santos, em São Paulo, Itaguaí, no Rio, e Suape, em Pernambuco. Avenidas foram fechadas pelos protestos, e a Via Dutra interditada nos dois sentidos. Em capitais como Belo Horizonte, Salvador, Vitória, Manaus e Porto Alegre, houve falta de ônibus nas ruas, e no Rio, embora o sistema de transporte tenha funcionado quase normalmente, bancos e lojas do centro da cidade fecharam as portas e a violência foi das maiores entre as capitais.

Diante das manifestações de junho, no entanto, o que houve ontem no país não teve peso político relevante, e essa diferença se acentuava mais quando se via claramente a tentativa de pegar carona nas manifestações espontâneas que, estas sim, mudaram a face do país.

Pedir uma vaga “democratização da mídia”, por exemplo, é simplesmente tentar levar para as ruas a reivindicação de pequenos grupos de pressão, apoiados por blogs e revistas chapas-brancas, como se fosse uma aspiração da nacionalidade.

A capacidade de mobilização das redes sociais mostrou-se muito maior do que a das centrais sindicais, e os que se queixavam da desorganização das manifestações anteriores, que não tinham carro de som para guiar os reivindicantes, devem ter visto ontem que não basta ter os equipamentos para mobilizar os cidadãos, que foram às ruas em muito maior número para defender os interesses da sociedade, e não a agenda deste ou daquele partido político.

Melhores serviços públicos, mais educação e mais saúde, são temas universais que unem os que querem aumentar o grau de cidadania no país. As questões trabalhistas que motivaram o Dia Nacional de Lutas são de interesse restrito a corporações de trabalhadores que legitimamente usam seus representantes sindicais para defender suas causas, mas não representam os interesses da maioria da população.

Somem-se a isso as divergências políticas entre as centrais sindicais, e teremos razões de sobra para entender o relativo fracasso das manifestações de ontem pelo país. A Força Sindical queria colocar a presidente Dilma na roda das manifestações, mas a CUT não queria.

Houve manifestações isoladas da central comandada pelo deputado federal Paulo Pereira, o Paulinho da Força contra a presidente, e o pedido de demissão do ministro da Fazenda Guido Mantega, e ficou no ar a ameaça de convocação de uma greve geral. Mas ele está na oposição ao governo, depois de ter sido um fiel aliado, e suas movimentações têm objetivos eleitorais claros, o que retira delas a credibilidade.

Os partidos políticos ficaram mais uma vez fora das manifestações, desta por que as centrais sindicais não quiseram misturar as estações com entidades tão rejeitadas pela opinião pública. Mas não dá para esconder de uma hora para outra que as centrais sindicais são aliadas de partidos, como a CUT é do PT, a Força Sindical tem ligações com o PDT e está querendo criar seu próprio partido.

Quem tentou tirar partido da fragilidade do Congresso foi o ministro Aloísio Mercadante, promovido a principal interlocutor político do Palácio do Planalto. A entrevista à Folha em que ele ameaça o Congresso com uma vingança dos eleitores nas urnas em 2014 se não ouvirem as vozes das ruas, como se as manifestações nada tivessem a ver com a presidente Dilma e o governo do qual se tornou porta-voz, certamente dificultará ainda mais a relação entre a base aliada e o governo.

O Globo, 12/07/2013

O Globo, 12/07/2013