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O fato novo

 

O PSD pode não ser nem de esquerda nem de direita nem de centro, mas talvez por isso mesmo esteja no centro da política nacional pouco depois de ter sido confirmado como o 28º partido político da cena brasileira. Com uma bancada que deve ultrapassar a do PSDB na Câmara, o partido do Kassab, como já está sendo conhecido nos meios políticos, colocou o prefeito paulistano como peça-chave no cenário político paulista, dando-lhe condições de se transformar em ponto de equilíbrio da política nacional.

Em política, diz-se que só existem dois fatos insuperáveis: o fato novo e o fato consumado. O PSD une os dois.

Quem via o ex-governador José Serra por trás da formação do PSD deve ter-se surpreendido com a adesão na undécima hora do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, com status de candidato potencial à prefeitura de São Paulo.

Serra escolheu o BC de Meirelles para seus maiores ataques durante a campanha presidencial de 2010, e certamente um acordo político com ele não se casa bem com seus planos, ainda mais agora que Serra apoia decididamente a nova fase do Banco Central sob Dilma, cortando juros. Faz mais sentido um acordo improvável que já está delineado com Paulinho da Força do que com Meirelles, pelo menos na disputa em São Paulo, que mais uma vez é o centro da disputa de poder que definirá os rumos da campanha presidencial.

Um acordo do PSD com o PSDB em São Paulo, primeiro para a prefeitura e depois para o governo estadual, é um ponto a favor das pretensões de Serra desde que o candidato a prefeito venha a ser o vice Afif Domingues.

Kassab se apresentando para ser o vice de Alckmin na disputa da reeleição em 2014 abre espaço em São Paulo para José Serra e atrapalha as ambições do senador Aécio Neves, que hoje parece ter o controle da maioria partidária em termos nacionais.

Mas a reação do governador Alckmin ao anúncio de Aécio de que se dispõe a ser candidato a presidente mesmo contra Lula indica que pelo menos num primeiro momento o sentimento paulista voltou a falar mais alto.

Alckmin lembrou diversos nomes, inclusive o de Serra, e, mesmo que Aécio tenha feito o mesmo em sua entrevista, as intenções são díspares.

Aécio quis ser gentil com os companheiros, mas deixando claro que considera que a hora é sua. Já Alckmin quis claramente frear a arrancada de Aécio, mesmo que ele próprio pareça não ambicionar a tarefa de voltar a se candidatar à Presidência da República. Mas Serra, para atrapalhar Aécio, é até capaz de incensar a candidatura de Alckmin, pondo-se como candidato a governador pelo PSDB com o apoio do PSD.

E aqui voltamos ao novo partido, que tem no PSB do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, seu maior fiador no campo político.

A possibilidade de uma fusão de siglas, cogitada no início da empreitada, parece descartada, mas, assim como em nível paulista Kassab sente-se devedor de Serra e vai apoiá-lo seja em que candidatura for, a nível nacional é Campos que tem a primazia. O pernambucano tanto pode dar um belo vice para uma reeleição de Dilma – pouco provável, a meu ver – quanto para a volta de Lula, o mais provável neste momento.

E oferecendo ainda em troca o apoio do PSD, que pode muito bem fazer as vezes do PMDB e, pelo menos no início, com custos políticos bem menores.

O conselho do ex-líder do DEM e mentor do PSD nos bastidores Jorge Bornhausen, para que Aécio Neves se aproximasse de Kassab para uma política comum para as novas gerações políticas, cada vez faz mais sentido.

O que se arma no horizonte político é uma reorganização partidária à moda antiga para dar apoio a uma nova geração, que já teve na dupla Aécio Neves-Eduardo Campos uma provável chapa presidencial e que hoje, ao sabor das mudanças de ventos políticos, tem de incluir Eduardo Campos e Gilberto Kassab.

Há um choque de gerações em andamento que pode tirar da cena figuras como Serra, mas pode também atingir o próprio Lula, que já encontra dificuldades para obter êxito em seus muitos movimentos políticos recentes.

Dentro do PT ele continua imbatível e parece estar conseguindo impor, até agora, a candidatura do ministro da Educação, Fernando Haddad, à Prefeitura de São Paulo.

Porém, os fatos recentes podem atrapalhar seus planos, além da reação do grupo da senadora Marta Suplicy.

O aparecimento no horizonte do nome de Henrique Meirelles, em vez de reforçar a posição de Lula, apenas o enfraquece.

Seja porque dividiria o eleitorado petista que acredita que Meirelles também representa Lula, seja pela possibilidade de união do PSD com o PSDB em torno de seu nome.

O nome de Meirelles (e sua política ortodoxa dos juros) lembra muito mais o tripé que consagrou a política econômica de Fernando Henrique Cardoso – meta de inflação, câmbio flutuante e superávit primário – do que a política petista, que, aliás, no momento, parece estar se afastando imprudentemente desse tripé em busca da manutenção de um crescimento arriscado do PIB num mundo em crise.

Lula já sentiu na pele a dificuldade de se impor fora do poder quando quis trazer os partidos da base do governo para a tese da reforma política petista, de lista fechada e financiamento público de campanha, e não conseguiu a adesão da maioria.

A estratégia de Aécio, que parece bem sustentada dentro do PSDB, está sendo dificultada pelo surgimento do PSD, do qual participou só subsidiariamente em Minas.

Sua união com o PSB de Eduardo Campos já foi mais provável, mas em compensação ele pode atrair partidos da base aliada que também estão incomodados com o novo PSD, a começar pelo PMDB, que sempre teve uma queda por seu nome.

A possibilidade de a base do governo permanecer unida na próxima eleição presidencial depende da concretização da candidatura de Lula.

Somente ele, assumindo novamente a expectativa de poder que gera, pode unir partidos tão distintos sob o mesmo guarda-chuva.

O Globo, 12/10/2011