Nada indica que teremos mudanças com a eleição do ano que vem, no sentido de que não existe no horizonte um nome que possa quebrar a polarização entre petistas e bolsonaristas. Apesar dos momentos difíceis por que passa, Lula dá sinais de que se candidatará à reeleição, convencido pelas pesquisas de opinião de que vencerá qualquer adversário, mas, sobretudo, confiante de que Bolsonaro não deixará crescer grama onde um potencial candidato da direita tentar pisar sem seu consentimento.
Lula, assim como Bolsonaro, está empenhado em eleger mais senadores, pois lá, no Senado, é que será disputado o jogo político do próximo governo, com a desejada impugnação do ministro Alexandre de Moraes pela direita nacional, que pretende montar uma bancada fortemente majoritária para poder vetar emendas constitucionais e definir os rumos da política nacional. Lula já confidenciou a amigos achar que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deve ir “para o sacrifício” e disputar uma das duas vagas ao Senado por São Paulo. Significa dizer que ele não seria o nome escolhido para substituí-lo se Lula decidir não concorrer à reeleição. Ou que não haverá essa vaga.
Bolsonaro continua empenhado em manter sob rédea curta os pretendentes a substituí-lo na disputa pelo Palácio do Planalto e com isso atrasa uma possível campanha unificada da direita. Foi-lhe proposta uma estratégia que aparentemente o beneficiaria: um acordo para uma pena de prisão domiciliar para ele, devido a sua saúde, e ele anunciaria apoio ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que assim teria tempo para montar sua campanha. Embora Bolsonaro tenha recusado a proposta com um palavrão, as articulações continuam à sua revelia, com a possibilidade de o MDB aderir à candidatura de Tarcísio, que apoiaria o prefeito Ricardo Nunes para lhe suceder.
Lula continua vulnerável na Presidência, com escândalos se sucedendo e uma inflação que corrói o poder de compra das classes mais baixas, sem que o governo consiga se desvencilhar. O de maior repercussão é a roubalheira contra os aposentados no INSS, que até agora não tem tido dos aliados uma ação digital capaz de neutralizar os ataques permanentes da direita. Era previsível que um vídeo do deputado federal Nikolas Ferreira sobre o assunto seria divulgado, e o governo tinha toda condição de se antecipar aos ataques para neutralizá-los.
A falta de organização no campo digital e a burocracia partidária que impede avanços individuais nas redes sem que o material seja aprovado pelo novo ministro da Comunicação, Sidônio Palmeira, dão um timing analógico à resposta ao ataque digital, que já tem perto de 100 milhões de visualizações. Se, por um lado, a demissão do ex-ministro Carlos Lupi dá ao governo a narrativa de que tomou as providências devidas depois de descoberta a armação no INSS, por outro fica a marca de corrupção em mais um governo petista. Com o agravante de ter deixado chefiando o ministério um remanescente da gestão Lupi, ligado também ao PDT. Mais: como Lupi já havia sido demitido pela presidente Dilma por um caso de corrupção, fica a impressão de que Lula está sempre disposto a acobertar seus amigos, como fez com a ex-primeira-dama do Peru, a quem acolheu como asilada política mesmo tendo sido condenada por corrupção no mesmo esquema montado no Brasil pelas empreiteiras, especialmente a Odebrecht.
A reação do PDT de anunciar a saída da base do governo em protesto contra a demissão de Lupi traz um problema até para o campo da esquerda, que se fragmenta às vésperas de um ano eleitoral. Como a crise promete permanecer no centro do debate político, a corrupção, que nas pesquisas de opinião já não aparecia como problema prioritário para a população, voltará a ser tema de campanha.