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Golpes estatísticos

 

O governo deu mais um passo no sentido de melhorar as suas estatísticas econômicas sem necessariamente melhorar a vida dos brasileiros miseráveis de maneira efetiva. Todas as famílias cadastradas no programa Bolsa Família passam a ter a garantia de que cada um de seus membros terá no mínimo R$ 70,00 por mês, faixa que marca o necessário para uma pessoa não ser considerada miserável estatisticamente. O fim da pobreza extrema é o principal mote da campanha de reeleição da presidente Dilma. Ninguém pode ser contra dar dinheiro a miseráveis, como anunciou ontem a presidente Dilma.mas dar a um mero ajuste estatístico no Bolsa Família o tom épico que ela deu chega a ser cruel uso da propaganda política.

Mesmo que sua situação concreta não melhore em relação a quando ganhava apenas R$ 1,00 a menos, ele estará fora da linha da pobreza extrema. Essa linha meramente estatística que separa a pobreza extrema da pobreza está dentro dos padrões do Banco Mundial, que considera U$ 1,00 dólar por dia o mínimo para definir quem está acima da linha da miséria absoluta. Mas aí temos novos problemas meramente “economicistas”.

Dependendo da cotação do dólar, precisa-se de mais que R$ 70,00 para acabar com a miséria absoluta. Além disso, o governo não reajusta desde 2009 esse valor pela inflação, o que congela o número de miseráveis. Assim como já houve casos em que o governo deu mais R$ 2,00 para o cidadão passar da linha de miséria, haverá muitos casos em que famílias receberão pouco mais de R$ 10,00 com a mudança anunciada, para constar da nova estatística que tirará milhões de pessoas da pobreza extrema, sem objetivamente melhorar suas vidas.  O mesmo efeito o governo consegue com a chamada “nova classe média” brasileira, que já representaria hoje mais de 50% da população brasileira. Essa classe é composta por famílias que têm uma renda mensal domiciliar total (somando todas as fontes) entre R$ 1.064,00 e R$ 4.561,00 que hoje, com o crédito mais amplo, entraram no mercado consumidor.

Além de questões como a inadimplência, há quem discuta os critérios de definição de classes e, sobretudo, essa maneira de encarar as classes sociais apenas pelo aspecto monetário, sem avaliar questões como educação, saúde e valores pessoais.

Mas não há dúvida de que a desigualdade vem sendo reduzida nos últimos anos graças aos programas sociais e ao aumento real do salário-mínimo, fortalecido pelo pleno emprego. A questão central é saber se essa situação é sustentável sem que reformas estruturais sejam feitas.

A interferência do governo cubano em questões internas brasileiras, como agora na visita da blogueira cubana Yoani Sánches, já acontecera outras vezes, como quando os boxeadores cubanos Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara fugiram da concentração durante os jogos do Pan no Rio e foram repatriados pelo governo brasileiro à bordo de um avião do governo venezuelano que pousou em Brasília na calada da noite.

Pois depois que a revista Veja denunciou uma armação do governo cubano com partidos políticos para pressionar a blogueira em sua visita ao país, todos os fatos vão se confirmando sem que o Itamaraty ou o Palácio do Planalto se preocupem em questionar o governo cubano sobre sua atuação indevida.

O embaixador de Cuba no Brasil, Carlos Zamora Rodríguez, reuniu um grupo de militantes do PT e do PC do B na embaixada do seu país, em Brasília, para distribuir um dossiê contra a blogueira e anunciar que ela seria vigiada. Por onde vai, Yoani Sánches é perseguida por manifestantes do PCdoB e do PT que não se limitam a protestar contra sua presença, o que seria aceitável em uma democracia, mas tentam impedir que fale e até mesmo agredi-la.
E da conspiração participou um funcionário da Secretaria-Geral da Presidência da República, especialista em redes sociais, que em seguida foi para Havana participar de um seminário sobre “guerra cibernética”.

O engraçado é que todos os textos que apareceram na internet nos chamados “blogs sujos” que formam a rede de apoio ao governo, muitos deles pagos pelo dinheiro oficial, usam os mesmos termos e as mesmas acusações, como se fossem escritos por uma só pessoa. No mínimo, têm a mesma origem, o CD distribuído na reunião da embaixada cubana em Brasília.

O Globo, 20/2/2013