Se não fizer coalizão, não governa, comentou o vice-presidente Hamilton Mourão. Mas se não satisfizer seu núcleo duro de seguidores, os 15% de radicais que reclamam dos acordos políticos, Bolsonaro também não governará. Foi para agradar seus radicais que chegou ao governo anunciando que não queria saber da “velha política”, como se fosse um novato naquele terreno.
Tentou negociar por temas com as bancadas evangélica, a da bala, a do agronegócio, e assim por diante. Não deu certo, pois o apoio suprapartidário não tinha condições de se impor em cada partido, cujas direções definem as posições a serem seguidas. Tentou governar pelas redes sociais, encurralando seus adversários, mas só conseguiu acirrar os ânimos com o Judiciário, especialmente o Supremo Tribunal Federal (STF), e o Legislativo.
Promoveu manifestações antidemocráticas, tentou criar um clima golpista que amedrontasse os demais Poderes, mas se isolou politicamente, revelando que seus radicais não estavam com essa força toda, nem as Forças Armadas estavam dispostas a bancar sua aventura totalitária.
À medida que seguidores começaram a ser presos por ações criminosas e ameaças a autoridades, e seu grande amigo Fabricio Queiroz reapareceu graças à Polícia Federal, que o encontrou na casa do advogado Frederick Wassef, a arrogância de Bolsonaro começou a dar lugar a um silêncio obsequioso.
O inquérito contra seu filho Flavio Bolsonaro no Ministério Público do Rio de Janeiro segue, e voltará para a primeira instância em agosto, quando o STF reafirmar a restrição ao foro privilegiado. Os do STF que o envolvem diretamente ou seus seguidores, também prosseguem, com provas sendo acumuladas. E o do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem o poder de impugnar a chapa presidencial.
O presidente está tentando se equilibrar em uma slack line muito estreita, entre a harmonia com os demais Poderes, e manter sua base mais dura, que reservou Saúde e Educação como áreas prioritárias para uma atuação ideológica. O caso do ministro da Educação é exemplar.
Para conter os olavistas, responsáveis pelos primeiros escolhidos, os militares palacianos foram buscar um militar que já lá estava, Carlos Decotelli. Que não chegou a tomar posse devido a polêmicas com seu currículo. O centrão então ocupou o espaço e indicou Renato Feder, Secretário de Educação do governo do Paraná, um técnico com ligações com o PSD, que foi bombardeado pelos militares, pelos laços políticos, e pelos olavistas, por não ser “ideológico” o suficiente.
Na Saúde, dois ministros técnicos saíram por não admitirem tentativas de intervenção ideológica nos ministérios. À falta de outro nome técnico e terrivelmente ideológico, Bolsonaro deixou no lugar, interinamente com ares de permanente, um General de Brigada, Eduardo Pazuello, especialista em logística, que considera estar cumprindo uma missão: “Sou militar da ativa. Missão dada é missão cumprida”.
Foi assim que o governo aprovou o uso de cloroquina para tratamento da Covid-19, que nenhum médico aceitara avalizar. Desta vez, os militares palacianos foram contra a permanência do General da ativa no cargo de ministro, com receio correto de que os problemas da pandemia cairiam na responsabilidade do Exército. Bolsonaro arranjou uma solução que não afrontou os militares, mas não resolveu a situação na Saúde. Estamos em plena pandemia sem ministro efetivo, com conhecimento de causa, há mais de mês.
Na Educação, não consegue nomear uma pessoa técnica após a saída do famigerado Abraham Weintraub. A guerra ideológica foi tão grande que Feder viu que o futuro para ele não era nada brilhante, e desistiu do convite.
Os militares têm um nome, Anderson Correia, diretor do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), de grande reputação na área de engenharia. Mas há uma dificuldade, ele não aceitaria ser ministro sem poder desmanchar a estrutura montada lá pelos ministros anteriores, olavistas de carteirinha.
Para escolher o novo ministro, Bolsonaro se vê entre três grupos: os radicais, o centrão, e os militares, que não querem políticos e são contra os olavistas. Vai ser difícil para ele se equilibrar entre o seu verdadeiro eu, que é radical e completamente sem controle, e o moderado, que negocia com os poderes, impossível de dar certo de tão artificial.