Há alguns anos participei em Quéretaro, no México, de uma reunião internacional — na qual entre os presentes estavam Henry Kissinger, Robert McNamara, Takeo Fukuda, Helmut Schmidt e muitos outros experts e estadistas mundiais —, que discutiu os problemas do futuro da humanidade, tema recorrente no InterAction Council. Dois problemas se destacavam entre os muitos que teriam de ser geridos pelos estados nacionais: as migrações e o balanço alimentar.
O homem sempre foi um migrante. Foi assim que ele ocupou toda a terra. Saiu da África e daí espalhou-se pela Ásia, Europa e depois, com a discutida teoria de ter atravessado o estreito de Bering, chegou à América. A verdade é que nessa ânsia de andar ele não deixou nenhuma ilha perdida no Pacífico sem que ali não tivesse se instalado. Suas motivações eram a segurança e a alimentação, pois viviam da coleta e da caça.
Tinham espaços a ocupar e terras a habitar. As migrações, no começo das civilizações, eram das culturas que se empurravam umas às outras. A macedônica e outros povos que forjaram a civilização grega, os celtas ocupando o Norte da Europa, os fenícios se expandindo pelo Mediterrâneo e tantos outros. Através do estudo dos DNAs e das mitocôndrias foi possível mapear os caminhos em que povos primitivos se moveram e se misturaram, num processo de miscigenação, de tal modo que cada um de nós tem um pedaço de cada lugar que se diluiu no tempo passado. Hoje, o mundo se tornou estreito, internacionalizado, encolheu através da velocidade dos transportes e sem desaparecer a cultura de mover-se, andar.
Agora o grande problema Europeu é como tratar os refugiados da Líbia, da Tunísia de toda a África. Da Líbia já saíram para Túnis 361 mil, para o Egito, 270 mil, para a Itália, 10 mil, para a Argélia, 18 mil, para o Níger, 60 mil, o Chade, 23 mil, além de outros milhares para o Sudão, Malta e outros destinos.
E agora Kadafi, vendo nessa onda humana que sai uma bomba que entrega aos invasores, liberou a saída a todos que quiserem emigrar, em alguns casos obrigando-os a embarcar sob a mira de armas. Muitos morrem na travessia do Mediterrâneo pela precariedade das embarcações e lotações desesperadas.
Se antigamente o homem emigrava por comida e espaço, hoje ele o faz por motivos políticos ou pelo desejo de melhor condição de vida. A miséria de um país pobre está para uma sociedade rica a apenas uma passagem de avião, de barco, ou cruzando barreiras de arame farpado, como no México.
A humanidade do futuro vai ter, além das armas nucleares, de resolver o problema das massas humanas em busca de pão e água.
Folha de São Paulo, 13/5/2011