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A emergência da vacina

 

A vacina da AstraZeneca está na fase três e, dependendo do resultado, pode ser feito o pedido de uso emergencial para que a Anvisa aprove por um comitê independente, como a Coronavac está fazendo. A vacinação, assim, poderia começar a ser feita pelo menos no Rio, onde está a Fiocruz, parceira da Universidade de Oxford, e em São Paulo com a vacina fabricada pela Sinovac chinesa. Isso se a politização da vacina não impedir a analise isenta da vacina chinesa, que será um trunfo do governador João Doria.

A vacinação da COVID-19 entre os grupos prioritários deverá ser feita de 15 em 15 dias, para cobrir o maior número de população de risco num períodos de dois meses. O ano inteiro poderá ser usado para cobrir o máximo possível da população, mas os grupos de risco têm que ser imunizados imediatamente, especialmente os servidores da saúde, que lidam diretamente com a pandemia, os voluntários que tomaram placebo nos testes, por uma questão humanitária, os velhos que estão internados em asilos e a população de mais de 75 anos.

As clínicas privadas poderão adquirir as vacinas diretamente dos produtores, e disputarão com os governos as doses. O acordo da Fiocruz com a AstraZeneca foi de que o custo fosse humanitário, U$ 3,16 a dose, e o governo entrou com R$ 1,9 bilhão aprovado ontem pelo Congresso. Não haverá vacina suficiente para todo mundo, no entanto, e não apenas no Brasil.

Em janeiro serão entregues 30 milhões de doses da vacina que está sendo feita sob risco na Fiocruz, que recebe o insumo farmacêutico ativo (Infa) do laboratório AstraZeneca e nacionalizará a fabricação no país em 2021 quando, a partir de março, a Fiocruz poderá fabricar 130 milhões de doses. Mas a pneumologista Margareth Dalcomo adverte que não haverá vacina para todo mundo.

Se somadas, as planilhas de produção da AstraZeneca, Sinovac, Sputinik V, Pfizer e Johnson serão fabricadas em 2021 apenas 2 bilhões de doses. Como o planeta tem 7,8 bilhões de habitantes, não será possível vacinar a população mundial no ano que vem. Uma nova “Revolta da Vacina”, em sentido oposto da acontecida no Brasil em 1904, quando a população se revoltou com a obrigatoriedade da vacina contra varíola, pode acontecer aqui devido à vacinação da COVID-19.  

Com a demora para que a vacina seja liberada no país, enquanto outros já até começarão a vacinação em caráter emergencial na semana que vem, como a Inglaterra, a Alemanha, a Itália e outros países europeus, a Rússia e a China, é possível que o governo se veja às voltas com protestos dos que querem ser vacinados, e não daqueles que são contra a vacinação obrigatória, como estimulava o presidente Bolsonaro.  

O Supremo Tribunal Federal (STF), ao tratar em breve do tema, pode autorizar os Estados a determinarem a obrigatoriedade ou não da vacinação, ou talvez até mesmo sanções federais para os que não se vacinarem. Tudo indica, porém que a vacinação acabará sendo obrigatória para passageiros de avião e para turistas que chegarem aos países.

O ministro da Saúde, Eduardo Pazzuelo, ao anunciar um embrião de plano de vacinação nacional, deixou a entender que ela entre nós só começará em março, mas nem isso está garantido. Há quem assegure que apenas no Outono de 2021, por volta de abril e maio, as vacinas estarão à disposição. Teremos então problemas com as vacinas de Oxford, em parceria com o Instituto Oswaldo Cruz no Rio, e a chinesa Coronavac, com o Instituto Butantã em São Paulo, pois estarão à disposição antes de março, mas sem autorização para serem distribuídas, devido à logística de distribuição.

Mesmo as doses que estarão liberadas em janeiro pela Fiocruz não serão distribuídas porque não haveria vacinas para todos. A vacinação em caráter emergencial só pode ser feita para casos determinados, e não pode ser usada no SUS. É o que determina a Anvisa, que lançou ontem as normas para solicitação de autorização de uso emergencial de vacinas contra Covid-19. No documento, a agência estabelece que a Diretoria Colegiada analisará cada pedido de uso emergencial separadamente, considerando dados de “qualidade, boas práticas de fabricação, estratégias de monitoramento e controle, resultados provisórios de ensaios clínicos, entre outras evidências científicas”.

O Globo, 03/12/2020