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Em busca do equilíbrio

 

Apesar de acusada desde o fim de 2014 de ter “sumido” da vida pública, a candidata da Rede Marina Silva tem uma resiliência incomum, vista como uma política não tradicional, embora tenha sido parlamentar durante muitos mandatos, desde vereadora no Acre até senadora e ministra no governo Lula.

Marina, com um desempenho estável nas pesquisas, de acordo com os dois maiores institutos, o Data Folha e Ibope, está em segundo lugar quando o ex-presidente Lula não aparece, situação em que também vence todos os demais concorrentes no segundo turno. E é a segunda opção da maioria dos entrevistados em pesquisa recente. 

Marina aparece também como a maior herdeira dos votos de Lula. É nesse vasto mar de indecisos que ela pretende buscar a força necessária para chegar ao segundo turno, embora nesta eleição tenha condições piores do que em 2010 e 2014, quando teve uma média de 20 milhões de votos em cada uma.

A maioria do eleitorado brasileiro é de mulheres, revelou o último censo, o mesmo acontecendo entre os indecisos. Marina é a única mulher entre os outros 12 candidatos homens que estarão na disputa, e vai poder falar desta posição privilegiada, embora tenha pouco mais de 20 segundos de tempo de propaganda eleitoral gratuita e um fundo partidário ínfimo diante do de seus adversários, principalmente do tucano Geraldo Alckmin, que terá praticamente a metade do tempo de propaganda e um fundo de R$ 800 milhões.

Marina, embora comece a campanha no páreo para chegar ao segundo turno, tem dois fortes candidatos que disputam quem vai enfrentar Bolsonaro no segundo turno se o candidato do PSL mantiver a resiliência que o mantém há mais de ano na frente das pesquisas quando Lula não aparece.

À esquerda, Ciro Gomes do PDT, e à direita, o tucano Geraldo Alckimin, além da incógnita do petista Fernando Haddad, que não se sabe nem mesmo se será o “poste” da vez de Lula. Marina, apesar da falta de estrutura, tentará se afastar de seus concorrentes fazendo campanha com “indignação e sensatez”.

Marina acha que tomou o lugar do PSDB quando esse esmoreceu na ação que pedia a cassação da chapa Dilma-Temer no Tribunal Superior Eleitoral.  No entanto, o partido que lidera, a Rede, se dividiu na votação em plenário, e votou contra na comissão, contrariando sua orientação.

Essa dubiedade parece a alguns truque político, a outros demonstração de falta de comando do próprio partido. Ao se manifestar pessoalmente na defesa das decisões do Juiz Sergio Moro, principalmente nos casos relativos ao ex-presidente Lula, tornou realidade o desligamento do PT, situação com que lidava com dificuldades nas campanhas anteriores.

Pensa assim ter aberto espaço ao eleitor de centro-esquerda, ou os mais desiludidos com Lula e o PT. Ao mesmo tempo, se cercando de economistas como André Lara Resende e Eduardo Gianetti ganhou, senão a confiança, a neutralidade do mercado, colocando-se como opção mais equilibrada caso Alckmin não deslanche.

O grande trunfo que vai apresentar nessa campanha é o fato de ter passado incólume pela Lava-Jato. Por não estar na Lava-Jato, ficou à vontade na liderança política da defesa contundente das ações do Ministério Público, Polícia Federal e decisões do STF na condenação dos denunciados.

Para levar suas posições ao eleitorado, Marina espera que uma presença forte nas redes sociais substituirá as campanhas tradicionais, reagrupando a rede de voluntários, conversando ela mesma diretamente com os internautas, participando dos debates e entrevistas.

Marina tem um eleitor bem diferente de eleições anteriores, onde se destacava um forte núcleo de jovens empreendedores, digitais e da esfera da sustentabilidade, inclusive um empresariado compromissado com o futuro do planeta. Hoje seu eleitorado está centrado na classe CDE, de ensino fundamental, sendo as mulheres uma parcela grande. E um forte contingente de evangélicos, que ela disputará com Bolsonaro e Cabo Daciolo.

Resta saber se a candidata da Rede convencerá o eleitorado de que tem energia suficiente para superar a falta de estrutura, e capacidade de enfrentar um Congresso hostil.

O Globo, 10/08/2018