O que está decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), com a efetivação suspensa pelo pedido de vista extemporâneo do ministro Dias Toffoli, é que, uma vez réu, o integrante da linha de substituição tem que ser afastado dessa posição, que o habilita a exercer a presidência da República. Se o próprio presidente não pode ser réu, muito menos alguém que tenha que substituí-lo eventualmente pode sê-lo.
Isso implica que, se for recebida uma denúncia contra o presidente do Senado, da Câmara ou do STF, esse agente automaticamente deve ser afastado dessa presidência, podendo, porém, permanecer no exercício do cargo de origem (senador, deputado ou ministro do STF). O mérito da medida é impedir que uma pessoa nessas condições exerça a liderança institucional máxima.
Uma suposta “linha sucessória” não existe, pois há apenas um sucessor legal do presidente brasileiro, que é seu vice, que o substitui em eventualidades, ou o sucede em caso de vacância permanente, por doença, morte ou impeachment. Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Renan Calheiros, assim como a presidente do Supremo, ministra Carmem Lucia, portanto, não fazem parte da linha sucessória, mas substituem o presidente por um período de no máximo 90 dias, para convocar eleições.
Do ponto de vista constitucional, portanto, Michel Temer não tem vice-presidente, assim como Itamar Franco e Sarney não tiveram, mas o partido Rede, que impetrou a ação que foi julgada ontem pelo plenário do Supremo defende que um réu não pode substituir o presidente da República, mesmo em caráter provisório.
Após o STF confirmar o julgamento, Renan Calheiros perderá automaticamente a presidência do Senado se tiver denúncia contra si recebida, e já há uma aguardando pauta. Ele não pode simplesmente "abrir mão" de assumir a presidência da República e passar para o próximo, afirma o Juiz Marlon Reis. Essa prerrogativa não é dele, mas do cargo. Por isso ele sai do cargo para que o Senado não perca a prerrogativa.
A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) apresentada pela Rede Sustentabilidade foi arquitetada na Faculdade de Direito da UERJ, pelos advogados Daniel Sarmento, principal autor da ação no Supremo, e Eduardo Mendonça, que ficou com o escritório de advocacia do hoje ministro do STF Luis Roberto Barroso, que por esta razão declarou-se impedido de participar do julgamento.
O pedido de vista feito por Toffoli, depois que cinco ministros já haviam dado seus votos a favor da tese, teve o efeito prático de ajudar o senador Renan Calheiros a permanecer na presidência do Senado mais tempo, provavelmente até o fim de seu mandato, que termina em janeiro.
Como o recesso do Judiciário é de 20 de dezembro a 20 de janeiro, dificilmente haverá tempo útil para o caso voltar a julgamento nesse período, mesmo que nele seja julgado, o que é improvável, um dos 11 processos contra ele que já está liberado pelo ministro Edson Facchin. Trata-se de decidir se a empreiteira Mendes Junior pagou pensão alimentícia à jornalista Mônica Veloso, com quem o parlamentar tem uma filha fora do casamento. O escândalo data de 2007 e provocou a renúncia de Renan da presidência do Senado, para não ser cassado.
A atitude de Toffoli foi tão extemporânea que o ministro Celso de Mello decidiu dar mesmo assim o sexto voto, que formou a maioria do plenário a favor da proibição de que um réu permaneça na linha de substituição do presidente da República.
Anteriormente, o ministro Toffoli havia sido derrotado pela maioria na primeira decisão do dia, quando se posicionou contra dar prosseguimento ao julgamento por “perda de objeto”, já que a ação original referia-se ao então presidente da Câmara Eduardo Cunha que já saiu da linha de substituição do presidente da República.
A suspensão do julgamento sem a formalização da decisão que já está tomada é um favor, voluntário ou não, ao presidente Michel Temer, que temia que a saída de Renan Calheiros da presidência do Senado prejudicasse a votação da PEC do controle de gastos ainda este ano.
O juiz Marlos Reis, conhecido por sua atuação na aprovação da Lei da Ficha Limpa, considera que a Câmara e o Senado não mais elegerão réus, ou potenciais réus, para a sua presidência. “O efeito profilático da medida para o futuro é avassalador”, comemora o juiz, que lançou a tese que foi encampada pela Rede num artigo no Globo, a propósito do então presidente da Câmara Eduardo Cunha.