A interinidade está fazendo mal ao novo governo. Os “profissionais” da política, como eram conhecidos os caciques do PMDB, estão errando mais do que se previa. Até mesmo quando acertam deixam margem para questionamentos. É o caso da decisão anunciada ontem pelo próprio presidente interino Michel Temer de suspender as nomeações em estatais e fundos de pensão, até que seja aprovada uma legislação que proíba interferências políticas nas escolhas, que deverão ser eminentemente técnicas.
Aparentemente é uma decisão correta, mas na prática demonstra apenas a falta de independência que o presidente tem para nomear membros de seu governo. Ele não precisou de nenhuma legislação ao nomear Pedro Parente para presidir a Petrobras. Por que necessitaria para a escolha de técnicos para outros órgãos estatais, como os do sistema elétrico, que já começava a ser loteado pelos políticos, especialmente do PMDB?
A decisão é tão inusitada que suscitou um comentário não menos inusitado do presidente do Senado, Renan Calheiros, aplaudindo a decisão, que classifica de “oportuna, e que repõe os critérios técnicos para preenchimento de cargos estratégicos no país".
Para quem indicou e manteve por 13 anos na presidência da Transpetro o ex-senador Sérgio Machado, que nada tinha de técnico e está delatando a distribuição de propina a todas as suas relações políticas enquanto esteve no comando da subsidiária da Petrobras, é uma nota que revela com o quanto de cinismo é feita a política nacional.
Da mesma maneira, bastou que um amigo de Temer, o ministro dos Esportes Henrique Eduardo Alves, fosse reconfirmado como um dos investigados na Operação Lava-Jato pelo Procurador-Geral da República Rodrigo Janot, que pediu a abertura de um inquérito contra ele, para que virasse letra morta a decisão, revelada pelo Chefe do Gabinete Civil Eliseu Padilha, de pedir o afastamento de qualquer um que entrasse no radar das investigações.
“Investigado não é culpado”, argumenta o próprio Temer, mas é evidente que é uma imprudência colocar num ministério ou em cargo de confiança, como a Secretaria da Mulher, pessoas que estejam sob investigação.
Ao lado das trapalhadas nas nomeações, houve ainda na semana passada o primeiro episódio explícito de disputa de poder dentro do círculo palaciano que ganhou repercussão política. O novo Advogado-Geral da União (AGU) Fábio Medina Osório foi envolvido em uma série de intrigas que visavam sua saída do governo.
Acusado de ter tomado indevidamente um avião da FAB para ir a Curitiba; ou de ter sido displicente no episódio da destituição do presidente da Empresa Brasileira de Comunicação, que acabou revertida pelo Supremo, na verdade Medina Osório estava sendo vítima de uma intriga política que ele atribui ao Secretário de Assuntos Jurídicos do Gabinete Civil, Gustavo do Vale Rocha, afilhado de Eduardo Cunha, que na verdade foi quem tratou do caso da EBC.
A FAB, em nota oficial, negou que tenha havido qualquer irregularidade no transporte da equipe da AGU a Curitiba. A tentativa de fritá-lo acabou levantando a suspeita de que uma atitude recente, de anunciar um processo contra as empreiteiras atingidas pela Operação Lava-Jato, pedindo R$ 11 bilhões de indenização ao Tesouro, possa ter incomodado setores importantes, que negociam um acordo de leniência mais favorável às empreiteiras.
Medina Osório foi a Curitiba para um encontro com os Procuradores do Lava-Jato, que são críticos da nova lei de leniência. E o processo foi aberto no Paraná, certamente de acordo com os Procuradores. Várias instituições como a Associação dos Juízes Federais (Ajufe); a Associação Nacional dos Advogados da União (Anauni), os próprios integrantes da Advocacia-Geral da União, saíram em defesa de Medina Osório.
Seu caso pode ser explicado de um lado pela disputa de poder num governo que mal começou, e por outro pela necessidade de trabalhar em equipe sem perder a autonomia. Pode ser que seu estilo impetuoso, digamos assim, tenha deixado espaço para as intrigas e mal-entendidos, mas também não há dúvidas de que ele representa uma posição firme no combate à corrupção que o governo Temer tem que preservar.