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Discutindo a relação

 

Ontem à noite, mais uma vez, a cúpula do PSDB reuniu-se com o presidente interino Michel Temer para uma DR (discutir a relação). A relação política entre PMDB e PSDB, o principal aliado do governo Temer no Congresso, passa sempre por altos e baixos, e agora mais notadamente, pois o governo de transição desaguará necessariamente na eleição presidencial de 2018 em que os dois partidos deverão ter candidatos próprios.

Os tucanos têm três candidatos potenciais em disputa interna, os senadores Aécio Neves e José Serra, ministro das Relações Exteriores de Temer, e o governador de São Paulo Geraldo Alckmin. O projeto de cada um deles depende do fracasso do outro, numa equação difícil de fechar.  

Além disso, se o governo de Michel Temer der minimamente certo, haverá a pressão no PMDB para que ele tente a reeleição, embora o compromisso de que não concorrerá seja repetido a cada momento em que a hipótese é levantada.

O lance mais recente foi do presidente da Câmara Rodrigo Maia, que lançou a ideia de candidatura de Temer, sugerindo que nesse caso o DEM, tradicional aliado dos tucanos, também o apoiaria.

Mas há outro candidato potencial no governo Temer, o ministro da Fazenda Henrique Meirelles, aliás oriundo do PSDB, e líderes tucanos já veem nas concessões que faz no Congresso para aprovar a lei de limite de gastos sinais de que também ele estaria mordido pela mosca azul e, por isso, não teria a disposição devida para realizar as reformas estruturais de que o país precisa, muitas delas impopulares.

Aos boatos que dão conta de que os tucanos pediriam uma declaração formal de Meirelles e Temer de que não serão candidatos a presidente da República em 2018, o senador Aécio Neves, presidente do PSDB, responde que a questão central não é essa, mas a disposição de fazer as reformas, que não podem estar subordinadas aos projetos políticos pessoais.

Um dos assessores mais influentes do novo governo, o secretário das privatizações Moreira Franco, por sinal sogro por afinidade de Rodrigo Maia (sua enteada é casada com o presidente da Câmara), havia saído na semana passada em defesa de Meirelles, dizendo que ele estava sendo vítima de uma manipulação política dos tucanos.

Todo esse desentendimento pontual não impede que a aliança se mantenha, mas demonstra as dificuldades que temos com governo de coalizão, mesmo esse, baseado em projetos políticos semelhantes. Governos de coalizão equivocados como os de Dilma Rousseff, por exemplo, geram relacionamentos políticos frágeis, pois, como já escrevi anteriormente sobre governos petistas, os ministérios eram transferidos para grupos políticos “de porteira fechada”, e, especialmente Dilma, deixava os ministros em paz para usar politicamente seu feudo desde que a deixassem em paz.

Esse comportamento arredio às negociações políticas, por fastio e não por honradez como costuma insinuar, vai criar constrangimentos na reunião do Senado que julgará o impeachment, já que vários ex-ministros estão hoje do outro lado. 

O cientista político Carlos Pereira, da Fundação Getúlio Vargas do Rio, um estudioso dos governos de coalizão, analisa aspectos do que chama de “gerência de coalizão” de governos recentes, em estudo feito em parceria com Samuel Pessoa e Fred Bertholini, que distanciam de forma muito clara o “petismo" do que considera o “normal” no presidencialismo multipartidário de coalizão brasileiro.

Ao compararem aspectos relacionados ao tamanho, heterogeneidade ideológica, fragmentação partidária, compartilhamento de poder e recursos com parceiros da coalizão, e distância de preferências entre a mediana da coalizão e a mediana do Congresso, “fica claro que as coalizões do PT (não apenas do governo Dilma) se distanciaram marcadamente do que chamamos de “normal” em governos de coalizão, gerando toda a sorte de animosidades e problemas com os parceiros, acarretando alto custo de governabilidade e necessidade crescente de recursos ilegais de recompensa”. 

Por outro lado, ele considera que a coalizão inicial do governo Temer retoma o padrão de normalidade (muito claro durante os governos FHC), ao montar “a coalizão mais homogênea e mais proporcional desde a transição para a democracia brasileira”.

Carlos Pereira registra que “além do mais, a preferência mediana de sua coalizão se aproxima da preferência mediana do Congresso”, o que apontaria uma maior probabilidade de aprovação de reformas complexas e impopulares.

Mas o cientista político da FGV Rio adverte: “Ainda é muito cedo para previsões definitivas ou mesmo se as escolhas de gerência do Presidente Temer serão consistentes ao longo do tempo. Mas é provável se esperar mais sucesso legislativo e menores custos de gerência do novo governo com seus parceiros, a despeito de uma maior fragmentação partidária”.

O Globo, 18/08/2016