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A busca de voto

 

Com o voto útil ficando mais decisivo na reta final da eleição, um estudo interessante do banco Itau sobre os eleitores que estão indecisos ou dispostos a votar nulo ou em branco pode dar uma contribuição para o entendimento do que poderá ser o quadro futuro.

Esses não-votos já estiveram em um índice recorde de 41% no começo de Junho na pesquisa Ibope, e caíram para 26% na última pesquisa de 11 de setembro. Nas eleições de 2014, diz o estudo, seguindo um padrão histórico de 1994 a 2014, chegando dois dias antes da eleição em torno de 12%.

Os analistas do banco fizeram um cruzamento entre o perfil dos eleitores de um candidato e o do eleitorado que está ainda hoje disposto a não dar seu voto para ninguém, na suposição, baseada no histórico, de que esse grupo acabará migrando para um deles.

Interessante é que o PT anunciava o índice recorde de não-votos como sinal de que o eleitorado estava protestando pela ausência de Lula na disputa presidencial, preso em Curitiba por corrupção e lavagem de dinheiro. 

Agora, vão em busca desse mesmo eleitorado, imaginando que ele é majoritariamente petista. Mas a análise feita pelo banco mostra que, ao contrário, os candidatos que mais combinam com esses eleitores são Marina Silva, da Rede, e Geraldo Alckmin do PSDB, dois dos quatro que disputam a ida ao segundo turno, sendo os outros Ciro Gomes, do PDT e o próprio Haddad do PT.
 
Esse cruzamento confirma a aposta de Alckmin de que a eleição será decidida na última semana, quem sabe nos dois últimos dias, pelo voto útil. 

Também Marina joga suas fichas no convencimento do eleitorado de que não é possível manter a polarização entre PT e PSDB. 
 
Os analistas do banco - e os bancos estão mais nervosos que o habitual com a possibilidade de o segundo turno ser vencido pela esquerda - consideram que os candidatos que tiverem perfis mais próximos desse eleitorado disposto hoje ao não-voto terão mais chances de captar mais apoio desse grupo, na medida em que a campanha avance. 

O estudo faz um cruzamento entre esses eleitores de acordo com a renda, a região e o nível de educação. Esses cenários confirmam o que as pesquisas estão indicando: Bolsonaro é o candidato que tem mais dificuldade para crescer, distante dos eleitores indecisos, ou que dizem votarão branco ou nulo. 
 
Apenas 33% dos eleitores do Bolsonaro ganham até dois salários mínimos, e eles são quase 60% desse grupo de defensores do não voto. O mesmo padrão mantém-se entre os eleitores que ganham de dois a cinco salários mínimos ( uma diferença de 13 pontos), e de cinco a dez salários mínimos, com uma diferença de 8 pontos. 

Por grau de instrução, Bolsonaro é também o mais distante dos eleitores dispostos a não darem seus votos a nenhum candidato até este momento. 

Os demais candidatos têm dificuldades nesse grupo, e a conclusão é de que os 26% que podem passar do não-voto ao voto se dividirão entre esses dois candidatos, Marina Silva e Geraldo Alckmin, o que pode dar uma nova configuração à disputa do segundo turno, na suposição de que uma das vagas já está nas mãos de Jair Bolsonaro. 

A dificuldade dele é não poder estar presente nesse final de campanha, e possivelmente na do segundo turno, depois da segunda operação a que foi submetido. Seus críticos dizem que essa poderá ser, ao contrário, uma vantagem, impedindo que se perca pelas palavras. 

Mas tudo indica que seus eleitores, mais cristalizados, gostam de sua retórica agressiva e direta. Não poder comparecer aos debates, sobretudo no segundo turno pode ser prejudicial a Bolsonaro se a eleição, como se espera, estiver embolada. 

Pelas pesquisas mais recentes, não há mais a certeza de que qualquer um ganha dele no segundo turno. O efeito do atentado sofrido, agravado pela nova cirurgia, parece estar sendo favorável a ele. 

Alckmin e Marina esperam que a eleição seja decidida nos últimos dias, como o voto útil de quem não quer ver a presidência sendo disputada pelos representantes dos extremos - Bolsonaro e Haddad -, e até Ciro Gomes, que está em busca dos votos de centro, vai ter dificuldade devido a sua oratória agressiva. 

Se houver a disposição do eleitor de buscar uma alternativa a esse polarização extremada, Marina Silva e Geraldo Alckmin têm mais chance. 

Se, no entanto, o eleitor estiver em busca de um salvador com uma bala de prata, os dois são os que têm perfil mais distante desse desejo.  

O Globo, 14/09/2018