Providencialmente para o governo Temer, a reforma da Previdência se transformou no tema central da campanha presidencial que já começou, mesmo que indiretamente. Depois de tempos patinando sem encontrar argumentos políticos convincentes de mobilização de sua base para a aprovação do projeto, o governo ganhou inesperadamente o argumento que faltava: PT e PSDB, cada qual à sua maneira, se colocam contra a reforma, aquele escancaradamente, este subrepticiamente, porque receiam que a reforma alavanque a economia, levando água para o moinho governista.
Essas atitudes partidárias de potenciais adversários estão convencendo a base governista na Câmara de que talvez o risco imediato de desagradar eleitores se transforme em trunfo de médio prazo, fazendo com que governistas disputem a eleição em condições econômicas favoráveis, com desemprego em baixa e investimentos em alta.
O discurso do combate aos privilégios está ganhando apoio na opinião pública, informam pesquisas internas, e as corporações de servidores públicos que se colocam contrárias à reforma não são, em sua maioria, eleitores dos partidos do centrão, e sim do PT, que deu continuidade à reforma previdenciária iniciada no governo de Fernando Henrique e engavetou-a para não trombar com os sindicatos.
O PSDB, que tem historicamente compromisso com as reformas e as privatizações, está correndo o risco de cometer o mesmo erro de 2006, quando o então candidato presidencial Geraldo Alckmin se abraçou às estatais para se livrar da pecha de privatista lançada pelo PT.
Agora, parte do partido já não representa um setor modernizador homogêneo da sociedade, contra os privilégios, mas busca o apoio desses mesmos privilegiados, numa equivocada ânsia de votos onde não é bem visto, pelas suas virtudes, das quais abre mão para cultivar defeitos.
Verdade seja dita, o governador Geraldo Alckmin mantém o discurso a favor da reforma da Previdência. Só não tem força para fechar questão, diante da reação de um grupo minoritário. Dependendo do tamanho dessa dissidência, pode ser que o partido se reencontre com seus valores.
O governo, enfim, encontrou uma linguagem efetiva para reunificar sua base partidária, colocando na mente de seus apoiadores a dúvida cruel: se não aprovarem a reforma, quem ganhará é o PT, que a combate, e não necessariamente os governistas. E a conseqüência será a piora da economia, fazendo com que a oposição chegue à eleição reforçada.
O governo terá que apertar o cinto mais fortemente para compensar a repercussão negativa da derrota. Se a reforma da Previdência for aprovada, e a economia pegar ritmo de crescimento, os beneficiados serão os governistas. Não votar, portanto, não é uma opção para quem está no barco do governo, incluindo nesses até mesmo os que votaram a favor da continuação das investigações contra Temer.
Tratados em conseqüência como inimigos a serem destruídos, estão sendo aceitos de volta ao ninho governista, mesmo que com ressalvas.Voltaram a receber benesses, mesmo que em medida menor que os fiéis. Neste fim de semana está sendo decidido se é possível votar a reforma na semana de 18, ou se a dificuldade persistente obrigará a adiar o esforço.
Nesse caso, a decisão é marcar a votação para o dia 2 de fevereiro, na volta do recesso. Assim o governo teria mais de um mês para trabalhar as dissidências que ainda resistem. A volta do recesso pode ser benéfica, se o deputado constatar na sua base que o bicho não é tão feio quanto parece. Mas há o risco de muitos desistirem, se sentirem de perto a rejeição à reforma da Previdência.