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A advertência de Barbosa

 

O mundo está de olho no Brasil”, adverte o presidente do Supremo Tribunal Federal ministro Joaquim Barbosa, dizendo que esse nosso jeito de “não fazer as coisas fingindo que está fazendo” coloca em risco nossa credibilidade como país. Barbosa, que está nos Estados Unidos para uma palestra na Universidade de Princeton e uma homenagem da revista Time que o colocou como uma das cem pessoas mais influentes do mundo está se referindo ao julgamento do mensalão, que, divulgado o acórdão, será retomado dentro de 10 dias com os embargos da defesa.

Ele considera absurda a possibilidade de haver um novo julgamento, pois o Supremo é a última instância do Judiciário, e diz que a sociedade brasileira não vai entender se houver uma mudança de posição do STF em tão pouco tempo. O presidente do Supremo não quis falar especificamente sobre os “embargos infringentes”, que considera não existirem mais, embora estejam previstos no regimento interno do STF. Este será o debate mais importante da próxima fase do julgamento, pois é através desses embargos, e não dos “embargos de declaração”, que alguns réus poderão ter suas penas reduzidas.

Assim como Barbosa, alguns ministros também consideram que os “embargos infringentes” não existem mais desde que a lei 8038, de 1990, regulamentou os processos nos tribunais superiores e não os previu para o STF. De lá para cá, será a primeira vez que o Supremo enfrentará essa questão, pois desde então não houve pedidos para “embargos infringentes” nos julgamentos ocorridos naquela Suprema Corte.

No caso atual, se confirmada a tendência da maioria do plenário de aceitar os “embargos infringentes”, acontecerá uma situação esdrúxula, pois a maioria não levou em consideração o regimento interno quando dobrou o prazo para que a defesas apresentem seus embargos, preferindo seguir o Código de Processo Civil.

Os “embargos infringentes” que podem mudar a condenação de nada menos que 12 dos 25 réus em dois itens: formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. O primeiro item pode beneficiar o núcleo político do PT, a começar pelo ex-ministro José Dirceu, que é o que tem mais a ganhar. Condenado a 10 anos e 10 meses, se for absolvido da acusação de formação de quadrilha, terá 2 anos e 11 meses deduzidos de sua pena, e em vez de começar a servir em regime fechado, pegará o semi-aberto.

Outra condenada, Simone Vasconcellos, também terá a pena reduzida a menos de 10 anos, indo para regime semi-aberto. A mudança da pena pode ocorrer por que o plenário que fará a revisão do julgamento será diferente do que condenou. O ministro Teori Zavascki, que entrou no lugar de Cezar Peluso, votará pela primeira vez no caso. Como também o ministro Ayres Britto se aposentou, o plenário voltará a ter 10 votos, com a diferença que Peluso não votou em formação de quadrilha nem em lavagem de dinheiro, e portanto o placar neste momento está em 5 a 4 pela condenação, e não mais 6 a 4. Se o novo ministro concordar com os colegas que absolveram os condenados, o julgamento estará empatado, favorecendo os réus. Na questão da lavagem de dinheiro, o réu João Paulo Cunha tem uma vantagem ainda maior: o placar que o condenou, de 6 a 5, hoje já está empatado em 5 a 5. O novo voto do ministro Zavascki será decisivo.

O presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, pretende fazer uma defesa da não existência dos “embargos infringentes”, mas a tendência clara no plenário é seguir a posição do ministro Celso de Mello que, no julgamento anterior, contestou a tese da defesa de que não haveria duplo grau de jurisdição no julgamento do mensalão, o que seria contrário à defesa dos réus, alegando justamente com os “embargos infringentes” previstos no regimento interno.

Joaquim Barbosa está convencido de que agiu não com “intransigência”, como coloquei na coluna de sábado, mas com “coerência”, ao ficar isolado na votação em plenário sobre a ampliação do prazo para que a defesa analise o acórdão da Ação Penal 407, popularmente conhecido como do Mensalão. Barbosa continua achando que o STF não deveria ter flexibilizado a legislação, para evitar dar ao julgamento um caráter excepcional. “Eu agi sempre assim na minha vida, nunca deixei de cumprir estritamente a lei”, disse-me por telefone.

O Globo, 23/4/2013