Houve um tempo em que “mal de coluna” (não a cervical, mas a de jornal) era a falta de assunto; hoje é o excesso. Anda difícil escolher um tema diante de tanta oferta. Tem o barraco supremo do juiz do STF xingando o colega de “velhaco”. Tem a insegurança crônica no Rio, que registra o assalto, num só dia, a 19 turistas a caminho do Corcovado. Tem a condenação de Rosinha e tem o casal Mônica Moura e João Santana, marqueteiros dos ex-presidentes Lula e Dilma, fazendo afirmações surpreendentes, como se ainda houvesse com o que se surpreender nessa história. Só na primeira página de ontem, ela aparece dizendo que recebeu numa mala R$ 800 mil de um antigo ministro, hoje governador, e US$ 11 milhões de Nicolás Maduro, quando chanceler da Venezuela. Há detalhes curiosos, como propinas em caixa de sapato e pagamentos clandestinos dentro de sauna, sem falar nos supostos e-mails secretos para se comunicar com iolanda2606@gmail.com, que seria a ex-presidente. Folclore à parte, há a grave acusação de que Lula e Dilma sabiam da origem do pagamento ao casal com dinheiro da Odebrecht, o que os dois negam.
Tudo surgiu justamente no dia seguinte ao do depoimento de Lula em Curitiba, quando respondeu 82 vezes “não sei” ao juiz Sergio Moro (a conta é do repórter Felipe Branco Cruz), num desempenho que correspondeu ao que se propôs. Como começou dizendo que aquele processo era uma “farsa”, ele agiu como ator, com direito a inventar, criar, ser incoerente e a faltar com a verdade, o que, vamos convir, a política permite, ainda mais que o juiz havia declarado que o depoente podia até mentir. Lula chegou a recusar por vezes o papel principal, repassando-o a dona Marisa, que em vida foi tão discreta e agora passava a protagonista de alguns malfeitos atribuídos ao marido.
Ele às vezes foi over, e exagerou, ao fingir não saber, por exemplo, o que a imprensa noticiou fartamente na época que um diretor da Petrobras devolvera R$ 204 milhões roubados. “Quanto que ele devolveu?”, perguntou candidamente. “Roubou muito, hein!”, comentou. Outro número, e esse de fazer rir, foi a negação de que mantinha influência no PT, ele, que é desde a fundação a própria encarnação do partido, sendo capaz de eleger até um poste presidente, ou presidenta, como sempre se disse.
O erro de Lula foi não ter dado ouvidos ao juiz, quando este lembrou no início que aquela sessão era a oportunidade de o acusado apresentar sua defesa. Porém, em vez de fazer isso tecnicamente, o fez politicamente. Mesmo assim, há controvérsia. Ele pode ter saído do tribunal se achando vitorioso e indo comemorar com os militantes. Mas também pode ter saído juridicamente derrotado.