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Uma breve paixão

 

Frederich Nietzsche observa, com costumeira razão: “Sob cada pensamento se oculta uma paixão”. E ele se alonga: “Nossas paixões são a vegetação que cobre a rocha nua das ações”.

O que levou a Sartre, se não me engano, a considerar o homem como uma paixão. E é esse fogo lento que aquece o pensamento. E também ilumina.

Seja a paixão de servir com sua nobreza, a paixão de realizar coisas, a paixão de criar ou descobrir o universo. Tudo isso vai sustentando o engenho.

Nada é sozinho. E nos movemos entre conceitos e sonhos. Uns se misturam aos outros e, às vezes, não os conseguimos distinguir.

E se tudo é paixão, tudo é fogo que nos queima de amor. E o que sai do fogo, é que dura. Como se saísse da luz. E é o que não deixa que percamos a nós mesmos.

A batalha é a de sobreviver. Entre palavras e juízos. Ou sem juízo algum – no mistério de uma existência que se guarda. Por preservar dentro da criança. Se ela não morre, não morremos por dentro. Levando a infância que não se acha.

Machado de Assis assegura que “o menino é o pai do homem”. Porque o homem é a consequência do menino. O homen é a paixão do menino. Sendo o universo real, bem menor do que o de nossa imaginação. E é ela que nos levanta e nos faz inventar o que não sabemos.

E me vem a sentença de Blaise Pascal, autor de “Os pensamentos”.

“Nada de grande se faz em paixão.”Nada de grande se faz sem essa ala – vence quem nos empurra para adiante. E não deixa de ser uma invencível consciência.

Pois a paixão é amor que se repete e se amplia ao infinito. Como se um milagre nos impelisse.

Desconhecemos o amanhã, desconhecemos o que teremos de arrostar, mas não desistimos, enquanto tivermos energia. Ou fé. Ou não nos faltar lenha para essa chama.

Não desistiremos, enquanto respirarmos. Porque estar vivo é resistir. E o amor não envelhece, por se renovar. Muito menos envelhece, ao nos mostrarmos constantes.

Diz Machado de Assis que “os animais são as letras soltas do alfabeto, o homem é a sintaxe”. E Não há sintaxe maior do que levar ao futuro o que somos. Até a cintilante sintaxe das constelações. Por avançarmos de viver.

E os vivos só ficam bem onde avançam. Por pagar sempre o preço de cada coisa. E se a paixão em nós se multiplicar, também se multiplicará nossas grandezas. Por nos transformamos, aos poucos, no que amamos.

E, às vezes, o amor pode ser maior do que a vida. E essa, só vale ao possuir amor. O mais, só vale ao possuir amor. O mais, como o tempo, passa. Sem entender até quanto passou.

A Tribuna (ES), 12/03/2017