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O futuro da política (final)

 

Os sistemas eleitoral, partidário e de governo são esferas de ação independentes. A experiência empírica comprova, não só em nosso caso, mas nos de outros países que adotam o sistema proporcional, as conseqüências que o professor Maurice Duverger procurou demonstrar no seu livro pioneiro Os partidos políticos: esse sistema favorece a proliferação do espectro partidário, enquanto o sistema majoritário privilegia a sua contenção.


O pluralismo, sob o ponto de vista ideológico e doutrinário, é requisito essencial à democracia. Mas, sob ambos os pontos de vista, não há nem nunca houve em toda a história do pensamento político, mais do que duas, três ou quatro concepções diferentes. Sistemas com uma ou duas dezenas de partidos com representação parlamentar, como tem sido usual nos últimos cinqüenta anos, entre nós, costumam, muitas vezes, refletir apenas interesses de caráter personalista e não os de natureza doutrinária, programática ou filosófica.


Por isso mesmo, é fora de dúvida que os sistemas proporcionais necessitam de medidas adicionais que favoreçam a contenção partidária, ou pelo menos evite sua excessiva proliferação. Entre elas, a mais bem sucedida é a cláusula de desempenho, ou de barreira, utilizada em mais de 40 democracias contemporâneas e que teve início na antiga República Federal Alemã, em 1949. Esse instrumento vem sendo tentado entre nós, em diferentes modalidades, desde 1946, quando a legislação eleitoral estabeleceu o número mínimo de 10 mil votos, para que os partidos existentes tivessem direito à representação no Parlamento. Como esse umbral era inferior ao quociente eleitoral na maioria dos Estados, o princípio nunca teve aplicação prática. Desde aquele ano até hoje, em mais de cinco oportunidades diferentes, sua aplicação vem sendo sucessivamente tentada e invariavelmente procrastinada.


Em recente e polêmica decisão, o Supremo Tribunal Federal inviabilizou a aplicação do dispositivo contido no art. 13 da Lei dos Partidos (Lei nº 9096, de 19.09.1995), inquinando-a de inconstitucional, depois que a Constituinte de 1987/88, ao ignorar o requisito do desempenho eleitoral mínimo, invalidou todas as tentativas anteriores de aplicá-la (vide Emenda Constitucional nº 11/78). A efetivação dessa tentativa, que já estava prevista na versão original do Código Eleitoral de 1965 (atual art. 7º, § 1º da Lei dos Partidos, nº 9.096/95), é, contudo, requisito fundamental para desobstruir e tornar operativo o processo decisório no Legislativo, permitindo a formação de maiorias estáveis no Congresso Nacional.


É indispensável ressaltar que a adoção da cláusula de desempenho nas eleições não guarda relação direta com as exigências para a fundação de novos partidos. Assim, aplicada a cláusula de desempenho e mantida a tendência revelada nos três últimos pleitos, teremos de seis a oito partidos representados na Câmara dos Deputados. Embora muito se tenha discutido sobre a relevância ou não de se tomar em conta o número de partidos de cada sistema político, vale a advertência do professor Giovanni Sartori, em sua obra Partidos e sistemas partidários. Diz ele: “Para começar, o número de partidos indica imediatamente, ainda que de modo apenas aproximado, uma característica importante do sistema político: a medida que o poder político está ou não fragmentado, disperso ou concentrado.”


Mantendo-se o sistema proporcional, segundo o modelo vigente, ou optando-se pelo denominado sistema misto, de extração alemã, a cláusula de desempenho não tem por objetivo impedir a fundação nem o funcionamento dos partidos, porém, antes, visa assegurar a governabilidade e até mesmo a operosidade do sistema político. Essa foi a razão de sua adoção pela Alemanha. Já a implantação do sistema proporcional em listas, abertas ou não bloqueadas, ficaria condicionada à sua compatibilidade com o modelo de informatização das eleições que usamos no Brasil.


O grande inconveniente apontado na modalidade de listas fechadas e bloqueadas é a influência decisiva das cúpulas, ou das claques partidárias na escolha dos candidatos. Essa restrição, no entanto, pode ser prevenida pela exigência de que as convenções partidárias destinadas a escolher os candidatos, em todos os níveis, atendam à existência da participação numa proporção mínima de filiados, garantia que, além de assegurar a democracia interna no âmbito partidário, teria o dom de acentuar o papel ativo e os direitos dos militantes.


Jornal do Commercio (PE) 5/1/2008