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Mudanças climáticas e aridez política

 

Após o fracasso do encontro entre os chefes de governo do G-8 e os dos países emergentes, em Áquila, na Itália, o mundo tem menos tempo para construir um novo acordo para suceder ao Protocolo de Kyoto.


A preocupação quanto ao futuro do planeta no que diz respeito às mudanças climáticas está colocada com clareza solar; vem sendo discutida há vários anos em escala global por líderes e eminentes personalidades de diferentes organismos internacionais. Mas, do ponto de vista da ação política, pouco ou nada se fez de efetivo, de concreto.


Já se passaram 17 anos desde a Convenção sobre a Mudança do Clima realizada no Rio de Janeiro, à época, o maior evento internacional voltado para questões ambientais. E estamos vendo transcorrer 12 anos desde o Protocolo de Kyoto. O que mudou desde então? Muito pouco. Na verdade, há razões para acreditar que as coisas pioraram, infelizmente.


Nos países industrializados, o nível de emissões de gases de efeito estufa continua aumentando e os Estados Unidos, por exemplo, retiraram-se do protocolo durante o governo George W. Bush. Os países emergentes, que incluem grandes emissores, como a China, a Índia e o próprio Brasil - devemos confessá-lo -, não precisam cumprir metas de redução obrigatórias e, como seria de esperar, tampouco reduziram suas emissões. No Brasil, aliás, muitas vezes, temos a impressão de que estamos caminhando na direção contrária ao que foi acordado em Kyoto, no Rio e em tantas outras cidades que sediaram acordos e tratados sobre o tema.


Em dezembro se realizará a desejada reunião de Copenhagen, na qual se discutirá um acordo que substituirá o Protocolo de Kyoto, que expira em 2012. Muito se espera dessa reunião. Com grande expectativa aguardamos, por exemplo, as propostas que serão apresentadas pelo governo dos Estados Unidos da América. Tão importante, porém, quanto o posicionamento norte-americano será a posição dos principais países emergentes. China, Índia e Brasil estão entre os maiores emissores do planeta e devem ser instados a assumir metas obrigatórias de redução de emissões, o que não ocorreu em Kyoto.


No recente encontro em Áquila, que muitos consideraram um importante precursor do que deve acontecer em Copenhagen, não se chegou a um acordo a respeito das reduções. Os países desenvolvidos propuseram a redução de 50% das emissões até 2050, em relação aos níveis de 1990. Os países emergentes argumentaram mais de uma vez que uma redução desse nível é inviável para nações que ainda não completaram a sua industrialização e convivem com a miséria, a fome e outras mazelas sociais. Propuseram a redução de 40% até 2020, mas só para os países ricos. No fim das contas, o único e extremamente vago compromisso que resultou do acordo foi o estabelecimento de um limite de dois graus Celsius ao aumento do aquecimento global.


Crescimento econômico, pura e simplesmente, não é garantia de desenvolvimento. Hoje em dia está muitíssimo claro que o desenvolvimento envolve, no mínimo, três dimensões: o crescimento econômico, a justiça social e a sustentabilidade ambiental. Sem uma das pernas desse tripé não há que falar em desenvolvimento. É preciso, portanto, que o governo se convença, de uma vez por todas, de que a esfera ambiental e a esfera social são indissociáveis de qualquer discussão sobre o País, seja ela de ordem econômica ou política. O crescimento a qualquer preço - a História comprova - é uma bomba-relógio que explode, em geral, no colo da parcela menos favorecida da população.


Falta também conscientização - não apenas da população em geral, mas também dos agentes públicos - a respeito da profunda relação entre biodiversidade e crescimento econômico. Os defensores do crescimento econômico a qualquer preço devem ser os primeiros a entender que destruir o ambiente tem custos, e custos altíssimos. Segundo documento oficial resultante da Convenção de Biodiversidade Biológica, realizada no ano passado na Alemanha, a perda da biodiversidade custaria de 6% a 7% do produto mundial ao ano, até 2050.


Quanto mais pobre o país, maior o impacto negativo dessa lógica. Ter consciência é, portanto, fundamental para começar a resolver o problema. Foi assim em janeiro de 1999, quando a maxidesvalorização do real pôs em risco o futuro da nossa moeda. A população e o governo controlaram os gastos. Isso resultou em fatores positivos para que o Plano Real continuasse sua marcha vitoriosa.


O mesmo aconteceu nos processos de racionamento de energia, em função da irregularidade pluviométrica que enfrentamos entre os anos de 2001 e 2002. A população foi fundamental para o sucesso das medidas de racionalização do uso da energia e, por fim, retirou-nos da crise.


Creio que, diante de mais um desafio, o povo brasileiro não se recusará às exigências da nova dinâmica mundial, apesar de estarmos falando de alterações profundas na vida do nosso país.


A redução dos níveis de consumo e desperdício, a reutilização de produtos como embalagens de vidro e cascos de bebidas, a reciclagem de materiais, papéis e plásticos, a partir da coleta seletiva do lixo, são apenas algumas das medidas que cada um pode, individualmente, tomar para contribuir para o quadro mais amplo do combate às mudanças climáticas.


Certa feita, o então presidente Fernando Henrique Cardoso disse: "Não haverá desenvolvimento algum no futuro se continuarmos a agir predatoriamente." E ele não se referia apenas ao Brasil, mas a todas as nações do planeta. As alterações climáticas nos ameaçam. Não descuidemos, portanto, de todas as dimensões dessa que é a grande questão deste início do século 21.


Diário do Nordeste (CE), 6/9/2009