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Dos jogos feitos ao anticlímax

 

Os confrontos da mídia no segundo turno mostram a exaustão do debate e a ausência de toda carta na manga, de revelações ou trunfos guardados. Mais ainda, o bate-boca se confina a uma temática cansada. Nada se diz sobre a política externa, as reformas política ou tributária, nem sobre a redistribuição de renda nacional. Repete-se, sim, a discussão da paternidade do Bolsa Família, iniciativa que ganha unanimidade eleitoral.

E, mesmo assim, fica a dificuldade do entrelace entre a modéstia dos dinheiros dos mandatos de Fernando Henrique e a força das verbas trazidas à redução da miséria a partir do governo Lula. Vamos às urnas com uma consciência profunda dos dois Brasis, inclusive neste assento geográfico, da maioria maciça do voto dos desfavorecidos, em nosso Norte e Nordeste. As indignações crônicas contra a corrupção não chegaram a nova maré, na denúncia dos benefícios providos pela Petrobras.

Temia o petismo ser vitimado pelo paradoxo de seu próprio sucesso. A nova mobilidade social dos marginalizados poderia levar os favorecidos a partilhar, com uma baixa classe média, a sensibilidade moralista dos grupos já instalados em nosso mercado. As temáticas de desempenho, em porcentos de avanço ou retrocesso, em mentira de números, ou leviandades de informações, não levaram a possíveis alterações de voto. Mesmo porque se concentraram no estrito universo de Minas Gerais e no tira-teima de acusações da presidente e de defesa do ex-governador. Tem razão, aliás, Aécio, em pedir um debate prospectivo, mas o candidato oposicionista propõe-nos mais mudanças da burocracia e do aparelho do que efetivas políticas públicas e de redistribuição da riqueza nacional.

Estão em causa, sim, os horizontes distintos entre a consciência profunda do que foi a opção pelo petismo frente ao país abastado, a ver, em todo novo mandato, alternativas meramente reformistas diante da nação instalada. E esta vai toda, por força, ao voto por Aécio, no perfil de primeiro comungante das suas crenças e seu perfil na televisão. O que está em causa, sim, frente ao anticlímax desses últimos dias, é a manutenção, ou não, do desfecho em favor do “país de Lula” entre os dois Brasis.

O Globo, 23/10/2014